Rua da Paisagem, 220 – Vila da Serra BH / MG

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Por onde anda “Nossa Educação”?

O relatório “Educação para todos”, da Unesco (2010), apresenta o Brasil na 88ª posição no ranking de desenvolvimento educacional, estando atrás dos países mais pobres da América Latina, como o Paraguai, o Equador e a Bolívia. Outro dado alarmante divulgado no referido relatório é a repetência média que na América Latina e no Caribe é de pouco mais de 4%, enquanto no Brasil é de quase 19%. E segundo dados do Ministério da Educação, cerca de 195.000 crianças e jovens abandonam as escolas brasileiras anualmente, por terem déficits de aprendizagem (MEC/2007).

As estatísticas mundiais sobre o impacto dos transtornos causados pelas dificuldades de aprendizagem no desajuste na vida social são bastante preocupantes e o prognóstico do seu desconhecimento por parte de educadores e autoridades é extremamente negativo. Dados fornecidos pela Associação Brasileira de Dislexia e Associação Brasileira do Déficit de Atenção mostram que:

• Apenas 10% das crianças com dificuldades de aprendizagem atingem escolaridade média; 46% dessas crianças são diagnosticadas com ansiedade, comprometendo grande parte da educação fundamental;

• O risco de abuso de álcool por quem fracassa na escola é 3 a 6 vezes maior do que para outros indivíduos;

• Pessoas com baixa escolaridade sofrem uma freqüência significativamente mais alta de intoxicações acidentais, queimaduras, quedas, desemprego e divórcio;

• Crianças que abandonam a escola têm até 40% mais probabilidade de usarem drogas ilícitas na adolescência.

Outro fator que interfere negativamente no sucesso da aprendizagem é a visão. Dados da Organização Mundial de Saúde, apresentados pela oftalmologista Dra. Elizabeth Brant em fevereiro de 2007 e referendados em 2009, pelo Projeto Olhar Brasil (Ministério da Saúde/Ministério da Educação), falam por si: 30% das crianças em idade escolar apresentam problemas de refração.

Estima-se que 30 a 60% dos alunos com baixo rendimento acadêmico não fracassam na escola por causa do seu “mau comportamento” ou simplesmente porque se empenham pouco nos estudos, como se pensa. Estas são pessoas cujas habilidades sociais e cujo desempenho escolar são afetados pela falta de estímulos na infância, pela alimentação inadequada ou em decorrência de síndromes hereditárias e disfunções cerebrais, que resultam, por exemplo, em transtorno do déficit de atenção e/ou dislexia.

A evasão escolar e o mau desempenho individual em atividades laborais, com suas consequentes limitações na qualidade de vida e dificuldade de inclusão no mercado de trabalho, acarretam prejuízos não somente na vida do indivíduo com déficits de aprendizagem, mas prejudicam também as famílias dos mesmos, bem como o desenvolvimento do país, já que haverá mais gastos com saúde pública, desemprego e marginalidade. Portanto, é de grande relevância encontrar um modo de intervenção eficaz para essas crianças, visando não apenas sua qualidade de vida, mas também a redução dos gastos em instituições de apoio ao menor infrator e até mesmo nos presídios, já que a sintomatologia permanece por toda a vida e pode agravar se não tratada, gerando comportamentos agressivos e inabilidade social.

Diante de estatísticas tão alarmantes, devemos nos preocupar em traçar estratégias para primeiramente identificarmos precocemente os indivíduos portadores de algum déficit, transtorno ou distúrbio de aprendizagem, seja em salas de aula ou consultórios, e assim intervirmos ou encaminharmos para os profissionais capacitados, conferindo-lhes maiores chances de um futuro promissor.

É justamente esta a proposta do Projeto Bom Começo – Programa da Acompanhamento da Criança na Escola que, através de metodologia e tecnologia, permite a realização dos exames de triagem, tanto na entrada da escola, quanto em acompanhamento anual. Em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais, a Fundação Hospital de Olhos (FHO) realiza, em um primeiro momento, a capacitação dos profissionais envolvidos (professores, gestores e profissionais da saúde). Posteriormente, são então realizados os exames de triagem visual, auditiva e de leitura, sendo os resultados enviados diretamente para o banco de dados centralizado. A partir da informação compilada, é possível emitir relatórios e traçar pesquisas e estatísticas, que servirão tanto para gestores públicos quanto privados, na orientação de suas políticas.

Dentro desta proposta, entre os dias 3 e 8 de maio, cerca de 980 professores e gestores educacionais do município de Montes Claros, MG foram capacitados por meio da metodologia do Projeto Bom Começo, através da parceria com a prefeitura local, a Associação de Promoção e Ação Social (APAS) e a Fundação Hospital de Olhos. Deste contingente, 800 professores e educadores passaram por um Seminário para identificação de crianças com distúrbios de aprendizagem ligados à visão, dentro das salas de aula. Concomitantemente, outros 180 profissionais, como pedagogos, psicólogos, oftalmologistas e professores, participaram do Curso de Dislexia de Leitura, somando-se a rede de screeners da FHO, que está presente em 18 estados brasileiros, com mais de 800 membros aptos a trabalharem com crianças e adultos que apresentam a Síndrome de Irlen, um dos distúrbios de aprendizagem ligados à visão.

Como bem diz o Prof. Marcos Pinotti (LAPAN e UFMG), o Brasil não pode se dar ao luxo de perder uma criança por descuidos na educação ou saúde. Precisamos de todas elas no futuro. Desta forma, o Projeto Bom Começo foi desenvolvido com as percepções do Prof. Pinotti, visando modificar a realidade de milhares de crianças e adolescentes, que hoje encontram-se a par do sistema educacional, mesmo, muitas vezes, dentro das salas de aula.

Marina Roberta Vieira Nogueira
Fisioterapeuta, Screener e Pesquisadora – Hospital de Olhos

 

Poção mágica na educação?

Poção mágica na educação

Alguns poderiam ter ilusões quanto à fraca qualidade da nossa educação. Contudo, lá pela década de 60, começaram a aparecer os primeiros testes, mostrando o quão ruim ela era. A curiosidade inevitável passou a ser: Por que seriam tão lastimáveis as nossas escolas?

Os economistas se põem a campo para trabalhar estatisticamente os dados dos testes de rendimento escolar. Quem sabe desvendariam alguns segredos do nosso fracasso? Desde então, centenas de estudos se acumularam mostrando resultados bastante parecidos. A partir desses estudos (chamados de funções de produção, um nome do agrado dos economistas, mas que dá erisipela nos pedagogos), começamos a separar grandes categorias de variáveis explicativas.

Falamos daquelas medidas que captam as características pessoais do aluno (como inteligência e energia). Falamos também do seu meio socioeconômico, em que a educação, a riqueza e a ocupação dos pais tem peso expressivo, pois criam o caldo da cultura familiar, os valores e as formas de interação lingüística. De outro lado, está a escola e seus componentes: os professores, os administradores, os materiais, as formas de ensinar e de lidar com os alunos.

As pesquisas mostraram que os fatores mencionados acima, de fato, são os mais fortes determinantes do sucesso ou do fracasso escolar. Mostraram também os pesos relativos de cada um desses conjuntos. Embora os resultados não sejam exatamente iguais, de pesquisa à pesquisa, os fatores escolares têm sempre um peso menor. Tipicamente, daquela fração que estatisticamente explica as diferenças de rendimento escolar, entre um terço e um quarto cabe à escola. Ou seja, o resto, amplamente superior, cabe aos fatores pessoais e familiares.

Esse resultado se mostrou muito frustrante para pesquisadores e para aqueles interessados em melhorar a educação. A escola, em que podemos mexer e melhorar, tem um peso pequeno na determinação dos resultados. A família, e mais os elementos genéticos, têm um peso amplamente maior.

Não se pode mudar a genética. Nascemos com um potencial de inteligência, não mensurável, e ao chegar aos 5 ou 6 anos, já ocorreu o brutal impacto das diferenças de estimulação verbal e intelectual das famílias. E o que é pior, o alcance das intervenções que agentes externos podem fazer na família são muito limitados. Por exemplo, a educação dos pais é um dos fatores mais dramaticamente poderosos para determinar o sucesso escolar dos filhos. O mesmoacontece com sua renda. Mas nenhum dos dois podem ser modificados por políticas públicas.

A escola pode ser melhorada, mas seu tradicionalismo e inércia dificultam os aperfeiçoamentos. Há muitas linhas de ação, como melhorar o recrutamento e a formação dos professores, introduzir métodos didáticos de eficácia comprovada, escolher melhor os diretores e, por aí afora. A experiência mostra que tais táticas funcionam. Contudo, encontram sempre uma resistência espontânea da cultura escolar, além das lamentáveis barreiras ideológicas.

Certamente, a saúde dos alunos é um fator que afeta o rendimento escolar. Daí as preocupações em verificar acuidade visual e audição dos alunos. De fato, sabe-se que há uma fração de alunos de baixo rendimento que, na verdade, não têm problemas de Dislexia ou de ordem psicológica, mas deficiências de audição e visão.

Tradicionalmente, espera-se que algo como 3% da população escolar apresente problemas nessa linha, com um nível de gravidade que comprometa o aprendizado. Portanto, com exames simples e pouco dispendiosos, podemos identificar esses alunos e lidar com as terapias apropriadas para suas deficiências. Ou seja, de tudo que se pode fazer para consertar o nosso ensino, esses problemas de saúde são os que encontram uma resposta mais definitiva e uma intervenção menos dispendiosa. Mas afetam relativamente poucos.

Poucas intervenções são possíveis nas variáveis familiares. Muitas intervenções na escola são viáveis, mas são delicadas, caras e de lento impacto. As intervenções de saúde são fáceis e baratas, mas afetam uma proporção muito pequena da população-alvo.

Contudo, esse quadro começa a apresentar uma nova abertura. Descobrem-se problemas de visão, não detectados pelos testes convencionais de acuidade visual.

Esses testes antigos verificam se o paciente consegue ler letras colocadas a diferentes distâncias. Com ele, é possível identificar aqueles que precisam de lentes corretivas. Estamos aí, talvez, em faixas bem abaixo de 5%.

Acontece que a leitura não é de letras, uma a uma, mas do encadeamento delas em palavras e frases. Para que sejam lidas, dada a estreiteza do campo visual que consegue discriminar o tamanho das letras, o olho precisa se mover, acompanhando a seqüência de palavras. Mas são dois olhos que precisam se mover de forma sincronizada para fixar e registrar a imagem. Por conta de circuitos do sistema visual, que estão fora do globo ocular, há alguns para quem os dois olhos não conseguem se mover em perfeita sincronia. Isso dificulta a leitura, comprometendo a compreensão, tornando-a mais lenta, cansativa, difícil, por vezes, até mesmo, impossível depois das primeiras linhas.

Se for relativamente fácil identificar essa deficiência do sistema visual e se for possível uma intervenção para lidar com ela, estamos diante de uma nova abertura para melhorar o rendimento escolar. Felizmente, ambas as premissas tem uma resposta positiva.

Há aparelhos relativamente simples. Consistem em uma viseira com um instrumento que acompanha a movimentação ocular e mais um software apropriado para processar os dados captados . Em segundo lugar, descobriu-se que filtros bloqueando a transmissão de certas freqüências luminosas permitem corrigir a trajetória dos olhos obtendo melhor fixação e sincronização delas. Sendo assim, há terapias eficazes e que são pouco dispendiosas.

Portanto, esses achados científicos abrem uma nova fronteira, ao identificar e curar alunos cujas dificuldades de leitura estavam erroneamente identificadas. Se a incidência desses problemas fosse residual, seria um avanço importante para os poucos que sofrem desses desencontros nas trajetórias dos olhos. O que torna essa descoberta espantosa é a elevada incidência dessa síndrome. Esse talvez seja o dado mais precariamente medido nos dias de hoje. Ainda assim, estimativas muito preliminares sugerem que até 20% da população tem algum problema desse tipo.

A se confirmarem esses números, estamos diante de um déficit educacional que pode ser resolvido com medidas pouco dispendiosas e de impacto imediato. É difícil imaginar uma intervenção que tenha um impacto mais direto sobre o rendimento escolar de uma proporção muito significativa de alunos.

Quem está levantando essa lebre no Brasil e avançando muito rapidamente nas suas pesquisas é a equipe do Dr. Ricardo Guimarães. Graças a eles, parece que estamos no umbral de um salto muito significativo no que podemos fazer para melhorar a nossa educação. Em parceria com a UFMG, com financiamento do CNPq, estão sendo desenvolvidos aparelhos menos dispendiosos e mais eficientes para acompanhar a trajetória dos olhos. No lado da pesquisa, alguns municípios estão se voluntariando para uma aplicação universal nas escolas, permitindo a criação das bases de dados que responderão às nossas indagações. Há um futuro promissor e os órgão de financiamento público de pesquisa estão dispostos a apoiar programas nessa linha. Mas nesse momento, paremos um minuto para agradecer ao Dr. Ricardo Guimarães por ter se metido nesse assunto.

Prof. Cláudio M. Castro
Ph.D em Economia, escritor e pesquisador da área de educação

Pesquisa sobre os resultados do uso dos filtros espectrais

Cada vez mais pesquisadores estão estudando as dificuldades e transtornos de aprendizagem. Nos últimos anos, a dislexia, tem ser tornado um transtorno muito investigado. Da mesma forma que a dislexia contribui para dificuldades de leitura, a chamada Síndrome de Mears-Irlen(SMI) também pode ser obstáculo para aquisição da leitura envolvendo alterações em distintas áreas do Sistema Nervoso.

A SMI é um distúrbio visual-perceptivo cuja base neurológica é um déficit no córtex visual primário e, portanto, do processamento visual central, não detectado em exames oftalmológicos de rotina.

A sensibilidade do sistema visual a certos comprimentos de onda do espectro eletromagnético visível ao olho humano provoca distorções no processamento pós-retiniano, fazendo com que os impulsos elétricos cheguem ao córtex cerebral em momentos distintos, com perda de qualidade da interpretação visual, caracterizando uma desorganização no processamento cerebral das informações
recebidas pelo sistema visual. A SMI afeta 12-14% da população geral, pessoas de todas as idades, de qualquer nível intelectual.

Os primeiros estudos realizados no Brasil sobre o tema foram desenvolvidos no Hospital de Olhos de Minas Gerais a partir de 2005. Com o objetivo de padronizar todo o procedimento foi
elaborado e implementado um protocolo que é aplicado a todos os indivíduos encaminhados para atendimento pelo setor de Déficit de Aprendizagem relacionados a Visão. Este protocolo é dividido em dez etapas, que são realizadas em três dias consecutivos ou em alternados. A primeira é a etapa de Orientação à família e ao paciente, sendo este a seguir encaminhado para a Entrevista Inicial. Nesta etapa é realizada a avaliação fonoaudiológica, psicológica
e psicopedagógica. No mesmo dia é submetido a uma avaliação oftalmológica de rotina, com: ceratometria, tonometria, acuidade visual (refratometria 1 e 2 ordem), biomicroscopia, cover test
e fundoscopia.

No segundo dia o paciente passa por exames oftalmológicos específicos como: aberrometria, campo visual computadorizado, teste de visão funcional, exame ortóptico, campimetria de dupla freqüência e tomografia de coerência óptica.

No terceiro dia o paciente é submetido ao screening de Irlen, seguido pela avaliação de sua leitura pelo rastreador de movimentos oculares. Após concluir este teste passa pela avaliação neurovisual para a seleção individual de filtros espectrais. O relatório interdisciplinar e o laudo oftalmológico ao final são elaborados com as indicações terapêuticas pertinentes ao caso e, são entregues após o acompanhamento dos óculos. Na entrega dos óculos o paciente é submetido a novo exame de rastreamento da motilidade ocular e visão cromática.

Dessa forma, o objetivo deste estudo é verificar o grau de satisfação, melhora e uso relatados de forma objetiva pelos pacientes.

Guimarães, R. Q. ;
Guimarães, M. R. ;
Botelho, M. R.;
Romão, M. A. E.;
Mesquita, M. S.;
Faria, L. N.;
Guerra L. B.

Referências Bibliográficas:

1- IRLEN, H. Irlen Differential Perceptual Schedule. Long Beach, California: Perceptual Development
Corporation, 1987.
2- HOLLIS, J.; ALLEN, P.M. Screening for Meares–Irlen sensitivity in adults: can asissment methods predict changes in reading speed? Ophthal. Physiol. Opt. v. 26, p.566–571, 2006.
3- WILKINS, A.; HUANG, J.; CAO, Y. Visual stress theory and its application to reading and reading
tests. J. Res.Reading v.27, p.152–162, 2003.
4- EVANS, B. J. W.; JOSEPH, F. The effect of coloured filters on the rate of reading in an adult student
population. Ophthalmic and Physiological Optics. v.22, n6, p.535-545, 2002.
5- IRLEN, H. Scotopic Sensitivity/Irlen Syndrome – Hypothesis and Explanation of the Syndrome. Journal
of Behavioral Optometry, v.5,p. 62-65, 1997.

PEI: Uma nova proposta de intervenção na Dislexia e Síndrome de Irlen

Ler é mais difícil que falar. Enquanto a fala é aprendida naturalmente pelo homem, a leitura é ensinada por meio de um código de criação humana altamente complexo. O bom leitor é aquele que desenvolve as habilidades de decodificação desses códigos de maneira eficiente. Daí a necessidade de conceituarmos a dislexia como uma dificuldade que está relacionada com a percepção do texto escrito. A percepção visual do texto relaciona-se com os movimentos sacádicos e com as fixações do olho. Para Shaywitz, a leitura está relacionada com a percepção visual que é a capacidade de retirar informações e conhecimento do mundo visível. (Shaywitz, 2006). Por outro lado, numa abordagem psicolingüística, a dislexia é uma dificuldade na aprendizagem da leitura relacionada ao reconhecimento da correspondência entre os símbolos gráficos (grafema), o fonema e a transformação dos símbolos gráficos em linguagem verbal.

A descoberta da Síndrome de Irlen, cujo foco está no processamento visual e na sensibilidade à luz, disponibilizou aos profissionais uma ferramenta que ameniza as dificuldades. Estas ferramentas são os chamados “overlays” ou lâminas de contraste e os filtros espectrais que proporcionam conforto na leitura e mais concentração a esses pacientes. O ganho com esse novo método nos faz entusiastas desse recurso, mas, de alguma forma, nos leva a outra inquietação: o que mais podemos fazer para melhorar as dificuldades de aprendizagem relacionadas à leitura e escrita dessas pessoas?

“Não sabe se organizar”, “é desatento”, “começa e não termina uma tarefa”, “é impulsivo”, “tem boas idéias, mas não consegue colocá-las no papel”, “estuda, mas não consegue tirar boas notas na escola”, “não compreende o que lê” isso sem falar na auto estima comprometida. Essa é uma realidade que encontramos quando se trata de pessoas com dificuldades de aprendizagem.

Na experiência do consultório atendo pacientes com dificuldades de aprendizagem e outros que usam os filtros espectrais e apresentam dislexia. Os filtros liberam essa pessoa do esforço e do desconforto tornando-as mais atentas e menos estressadas no que se refere ao visual. Já o PEI (Programa de Enriquecimento Instrumental), criado pelo Prof Dr. Reuven Feuerstein, desenvolve e aprimora as operações mentais que estão deficientes e que impedem um bom desempenho acadêmico ou profissional. São elas: o trabalho com mais de uma fonte de informação, análise e síntese, percepção visual, orientação espaço-temporal, dentre muitas outras (Gomes, 2002). E a mais importante delas: o sentimento de competência.

“O uso dos filtros e o PEI modificaram minha vida, agora não tenho medo de enfrentar desafios… em pouco tempo, já consegui ler dois livros com um nível de compreensão que não tinha antes!”, é o que afirma a paciente Erica Werber de 24 anos.

Já Rafael Horta, 16 anos, que utiliza os filtros espectrais há quase um ano e está passando pelo PEI, a sensação é de mais segurança na escola, além da leitura ter se tornado um prazer e as notas terem melhorado. A diferença já é perceptível pela família e pela escola.

As pessoas que passam ou passaram pelo programa (tendo dislexia ou não) tornaram-se conscientes de suas dificuldades e de seus processos e passaram a criar novas estratégias para melhorar seu conhecimento e elevar seu sentimento de competência muitas vezes comprometido pelo fracasso escolar/profissional ou por uma dificuldade no processamento visual.

Nas palavras do Prof. Feuerstein: “Educar é uma aposta no outro”. Por isso, o PEI precisa ser conhecido nas escolas e clínicas para que a educação ganhe um novo olhar sobre o processo de aprendizagem e a hora de começar é agora!

Suely Mesquita
Psicopedagoga Clínica e Institucional do Hospital de Olhos
Mediadora do PEI pelo ICELP – Israel e Professora Universitária.

Parceria entre família, escola e profissionais

Família e escola são pontos de apoio e sustentação à criança. Desta forma, conhecer o aluno é uma tarefa primordial do professor e da escola, pois irá interferir no planejamento educacional mais adequado. Já a família, é o cenário onde se vivem experiências que orientam o comportamento do indivíduo para a vida. Além destas bases, o aluno pode contar ainda com o apoio multidisciplinar, cuja função é a de resgatar potencialidades individuais e fazer com que o sujeito compreenda melhor suas atitudes diante de atitudes dos outros.

Entender o indivíduo como parte de um sistema, com elementos que interagem entre si, influenciando cada parte e sendo por ela influenciado, traz uma luz à compreensão acerca do desenvolvimento humano, contribuindo para a reflexão sobre os contextos familiar, escolar e multidisciplinar, que tanto podem ser elementos de inclusão e segurança, como fontes de conflitos.

A parceria se baseia no relacionamento entre pessoas ou instâncias que apresentam objetivos comuns. No caso de crianças com dificuldades de aprendizagem, a parceria entre a família, a escola e também os profissionais que as acompanham deve ter como objetivo principal a criação de recursos que viabilizem o crescimento, o aperfeiçoamento acadêmico e pessoal destas crianças. Guenther (2006) enfatiza que educar é tarefa tão ampla, complexa e multidimensional, que é ingenuidade acreditar que poderia ser realizada por uma só entidade.

A partir do momento em que a escola, a família e os profissionais compreendem as dificuldades e os esforços da criança, é mais fácil buscar os recursos para ajudá-la a superar os problemas no processo de aprendizagem.

Na realidade, pode haver obstáculos na comunicação entre estas categorias. Snowling (2004) ressalta que os pais das crianças com dificuldades de aprendizagem tendem a ser percebidos de maneira negativa pela escola. Em geral, esses próprios pais tiveram dificuldade para aprender a ler e a escrever, e sua ansiedade com relação ao seu filho pode ser mesclada de culpa sobre sua própria inadequação na alfabetização. Porém, é exatamente neste ponto que a parceria pode e deve ser construída. A partir do momento em que o contexto é compreendido, o apoio se fortalece.

Em um dos casos atendidos pela equipe do Hospital de Olhos foi possível visualizar como funciona essa parceria ideal. Estavam presentes a equipe escolar (representada pela professora e a supervisora), a família e a equipe do hospital. A escola juntamente à família se mostrou interessada em se inteirar da conduta a ser realizada com o aluno a partir do novo tratamento. Nós do hospital ficamos inteirados sobre o modo como a escola trabalha e o que pensam e, portanto, entendemos melhor o dia a dia escolar. Esta interação trouxe segurança à própria criança e à família, aumentando a confiança na relação. Todos foram beneficiados!

Quanto mais eficaz for a comunicação, melhor será a parceria e mais positivos e significativos serão os resultados na formação do sujeito. Vida familiar e vida escolar são simultâneas e complementares. A participação dos pais na educação formal dos filhos deve ser constante e consciente. O modo como os professores percebem as limitações de seus alunos e o modo como alertam os pais sobre estas dificuldades faz toda a diferença na busca por ajuda. O apoio do profissional especializado contribui não só para a melhora pedagógica, emocional ou cognitiva, mas essencialmente na interface entre a escola e a família.

É muito importante que essas três instâncias se tornem parceiras diante da situação de dificuldade de aprendizagem da criança. Cada um deve sentir que tem algo a contribuir dentro de suas possibilidades para o melhor desenvolvimento das potencialidades e talentos da criança.

Marina Reis Botelho
Psicóloga Clínica – CRP 04/24476
Especialista em Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes Sociais
Departamento de Distúrbios de Aprendizagem relacionados à Visão
Hospital de Olhos de Minas Gerais

Referncias Bibliogrficas:

– GUENTHER, Zenita Cunha. Desenvolver capacidades e talentos: um conceito de inclusão. Petrópolis,RJ: Vozes, 2006.
– GUENTHER, Zenita Cunha. Nova Psicologia para a Educação: educando o Ser Humano. Bauru, SP: Canal6, 2009.
– SNOWLING, Margaret; STACKHOUSE, Joy e cols. Dislexia, fala e linguagem: um manual do professional. Porto Alegre, RS: Artmed, 2004.

Onde o prazer de fazer se confunde com o de ser

Onde o prazer de fazer se confunde com o de ser

O Projeto envolvendo a “Dislexia de Leitura” é a síntese de uma filosofia de atuação onde o maior beneficiado é o seu executor, aquele cuja atuação se volta em prol do aluno em dificuldades, do adulto limitado em sua habilidade de se informar pela leitura e do paciente com restrições em suas atividades diárias, estas, o impedem de se integrar com o ambiente que o cerca roubando-lhe a imprescindível oportunidade de plena realização como ser humano e cidadão.

Este projeto, inicialmente voltado para o trabalho médico da prevenção e saúde ocular, na infância, rapidamente se estendeu à escola através de crianças sem alterações oculares mas sob risco social e educacional por dificuldades no processamento visual.

A Visão, graças à evolução tecnológica, onde o processamento cerebral vai aos pouco sendo desvendado e mapeado, tem um impacto enorme na relação do Homem com o mundo. Dos 3 bilhões de estímulos que chegam ao cérebro por minuto, 2 bilhões se originam da visão e, durante uma aula qualquer, cerca de 70 a 90% de todo aprendizado se baseia nas informações colhidas pelo sistema visual!

As informações, em grande parte de natureza não verbal, fez com que nosso “olhar oftalmológico” buscasse raízes na psicopedagogia, na neurologia, nos terapeutas ocupacionais, na fonoaudiologia e psicologia para que, através de uma capilaridade crescente, os resultados no avanço e resgate escolar/acadêmico fossem maximizados.

Assim, através do Projeto “Dislexia de Leitura” tivemos acesso a um novo olhar: o do resgate da cidadania. Iniciado em 2007, este projeto já capacitou 536 profissionais, da área de Educação e Saúde. Através desses profissionais conseguimos compreender as limitações enfrentadas pelos portadores de dificuldades de leitura e cognição.

As várias dimensões da inclusão psico-social, descritas por esses profissionais, foram incorporadas pela equipe do H0lhos naturalmente, se expandindo para um olhar multidisciplinar, que torna muito mais eficiente o resgate individual de cada paciente. O nosso dia-a-dia atual é feito de desafios conquistados: gratos relatos de aprimoramento na leitura, na compreensão – que invariavelmente repercutem na auto-estima – na atmosfera familiar e, acima de tudo, na felicidade daquele ser humano anteriormente cercado de duvidas sobre seu real potencial.

Os déficits de aprendizado são um desafio, uma realidade difícil que abala muitos lares brasileiros desestabilizando a família, por exigir da mãe uma assimetria atencional em prol do filho “com dificuldades escolares” gerando tensões e cobranças no âmbito familiar e educacional com potencial de minar todo um equilíbrio interpessoal.

Conscientes destas nuances sociofamiliares, o H0lhos vem se esmerando em proporcionar uma abordagem responsável para os déficits de aprendizagem visuoperceptual que resulte em melhora rápida e aferível destes pacientes. Neste projeto, temos procurado Educar o Educador, esclarecendo as diferenças entre a Síndrome de Irlen e as demais formas de déficits da leitura e aprendizagem entre as quais destacamos a Dislexia, Déficits de Atenção e Hiperatividade além de assistência aos Traumatismos Cerebrais, Autismo e Visão Subnormal.

A Síndrome de Irlen tem como sintomas principais o desconforto visual que se manifesta pelo lacrimejamento, prurido ocular, fotofobia, dificuldades de sustentação da atenção visual, cefaléias e perda da nitidez da leitura com sensação de movimentação das palavras devido a uma distorção de origem neuroperceptual. Isolados ou em associação, estes sintomas sempre comprometem o desempenho, trazendo prejuízos acadêmicos e profissionais significativos. Embora possam ser severos, têm reabilitação rápida quando tratados, ao contrário da Dislexia, que sempre exigirá apoio interdisciplinar constante, pelo menos até que uma qualificação mínima na lectoescrita seja atingida. Nestes casos o diagnóstico interdisciplinar é fundamental e, através dos cursos de capacitação oferecidos pela Fundação Hospital de Olhos de Minas Gerais, podem ser atingidos. O entusiasmo dos participantes, a quem chamamos de Screeners, é contagiante e se reforça pela dedicação e trabalho realizados por 536 profissionais credenciados em 16 estados brasileiros.

Ao relembrar meu pai, Geraldo Reis, clínico geral em Tanabi, pequena cidade de São Paulo, ainda na década de 60, em sua atividade humanística, sempre assistindo gratuitamente e com extrema disponibilidade ao “Lar das Crianças” e “Lar dos Idosos ” compreendo agora, meio século depois, a extensão de sua realização profissional ao prestar assistência a esses locais. O privilégio de agregar, de assistir, de apoiar modificando em muitas instâncias uma perspectiva de vida e futuro é um privilégio de quem faz, muito mais do que de quem recebe!

É esta percepção que faz do vitorioso “Projeto Dislexia de Leitura”, do grupo multidisciplinar que nele atua e dos screeners credenciados, um compromisso para toda a vida!

Dra. Márcia Guimarães
Médica Oftalmologiasta e Diretora Clínica do HOlhos

O que é Audição?

O que é Audição

Para conseguirmos ouvir necessitamos da integridade de todas as estruturas do no sistema auditivo. As estruturas envolvidas no processo da audição são didaticamente divididas em três grupos, o ouvido externo, ouvido médio e ouvido interno.

1- O ouvido externo é composto pelo pavilhão auricular e o canal auditivo.
2- O ouvido médio é formado pela membrana timpânica e, a cadeia ossicular ( martelo, bigorna e estribo).
3- O ouvido interno é composto pela cóclea e os canais semicirculares.
Como ouvimos os sons?

O pavilhão auricular é responsável por captar os sons provenientes do ambiente, que são conduzidos pelo canal auditivo até chegar a membrana timpânica. O tímpano recebe então esta vibração vinda das ondas sonoras e, a transmite aos ossículos, movendo o martelo que faz vibrar a bigorna e por sua vez vibra o estribo. O estribo está anatomicamente ligado à cóclea pela janela oval (pequeno orifício), que lhe transmite o sinal elétrico. A cóclea está conectada ao nervo vestíbulo-coclear, VIII par craniano, que envia a este o impulso nervoso. O impulso nervoso é conduzido ao centro de audição do córtex cerebral, que é responsável por interpretar estes sinais nervosos.

O que é Processamento Auditivo Central (PAC)?

“Processamento auditivo se refere aos processos envolvidos na detecção, na análise e na interpretação de eventos sonoros. Estes processos acontecem no sistema auditivo periférico e no sistema auditivo central. É desenvolvido nos primeiros anos de vida, portanto é a partir da experienciação do mundo sonoro que aprendemos a ouvir.”

É o processo de decodificação das ondas sonoras desde a orelha externa até o córtex cerebral, ou seja, a capacidade de analisar, associar e interpretar as informações sonoras que nos chegam pelo sentido da audição.

Quais são as habilidades auditivas centrais testadas?

Como ainda não conseguimos identificar com detalhes como o sistema auditivo realiza o processamento auditivo, identificamos algumas habilidades que devem ser testadas:

Atenção seletiva: é a capacidade de selecionar estímulos, é avaliado através de estímulos verbais de escrita dicótica.

Detecção do som: é a capacidade de perceber, identificar a presença de um som , é avaliado através de audiometria , discriminação vocal , timpanometria e pesquisa de reflexo.

Sensação sonora: é quando um estímulo é recebido pelo sentido da audição , é quando o indivíduo tem a sensação se o som é alto ou baixo , forte ou fraco ,longo ou curto.

Discriminação: é o processo de detectar diferenças entre os estímulos sonoros.

Localização: é saber local da origem do som, é avaliado através da localização sonora em cinco direções.

Reconhecimento: requer aprendizado, é avaliado através de logoaudiometria pediátrica, para o reconhecimento de frases na presença de mensagem.

Compreensão: dar significado ao som escutado.

Memória: arquivar informações e recuperá-las quando houver necessidade , é avaliado através de memória seqüencial para sons verbais (pa ,ta, ca) e não verbais (guizo, coco, sino, agogô).

O que é um distúrbio do processamento Auditivo Central (DPAC)?

“É uma falha no desenvolvimento das habilidades perceptivas auditivas”; mesmo com audição normal, é totalmente diferente de perda auditiva. Em geral encontra-se associado a dificuldades de aprendizagem.

Crianças portadoras de distúrbio de aprendizagem tem dificuldades em vários aspectos do processamento auditivo lingüístico e apresentam falhas cognitivas .É possível que comprometimentos lingüísticos ou cognitivos possam ser resultantes de problemas perceptuais.

Sintomas do Distúrbio do processamento Central Auditivo (DPAC):

– Apresenta dificuldade em manter atenção aos sons;
– Dificuldade em escutar em ambientes ruidosos;
– Dificuldade na aprendizagem da leitura e escrita;
– Dificuldade em compreender o que lê;
– Necessidade de ser chamado várias vezes (“parece” não escutar);
– Não entende o que foi dito;
– Solicita com freqüência a repetição das informações: Ah? O quê? Pode repetir?
– Dificuldade em entender expressões com duplo sentido ou piadas ou idéias abstratas;
– Dificuldade ao dar um recado ou contar uma história;
– Problemas de memória para nomes, datas, números e etc;
– Dificuldade em acompanhar uma conversa, aula ou palestra com outras pessoas falando ao mesmo tempo;
– Problemas de fala (troca /L/R/S/E/CH/), principalmente os sons /R/ e /L/;
– Alterações de pronúncia;
– Dificuldade em localizar a origem dos sons.
– Dificuldades com o significado das palavras;
– Inversões de letras;
-Dificuldade em associar letras do alfabeto com seus respectivos sons;
– Rendimento escolar Inferior em leitura, gramática, ortografia, matemática;
– Dificuldade em aprender uma língua estrangeira.

O que pode causar o DPAC?

– Genética, um grande número de casos é hereditário, pais e filhos apresentam características semelhantes;
– Otites freqüentes durante os 3 (três) primeiros anos de vida (Processos alérgicos respiratórios, tais como sinusites, rinites e até mesmo refluxo gastro-faríngeo estão comumente associados);
– Permanência em UTI-Neonatal por mais de 48 horas;
– Experiências auditivas insuficientes durante a 1ª infância.

Os sintomas comportamentais de crianças encaminhadas para a avaliação do PAC:

Crianças com alteração de comportamento, de atenção e dificuldades auditivas não orgânicas.
Crianças com suspeita de distúrbio de aprendizagem, cuja queixa é apresentada pelos pais ou professores.
Crianças encaminhadas por apresentarem distúrbio de comportamento social.

Laura Niquini de Faria Fonoaudióloga do Hospital de Olhos -CRFa. 6143/MG

Referncias Bibliogrficas:

1 CIASCA, S. M. (org.) Distúrbios de aprendizagem: proposta de avaliação interdisciplinar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003, 220p.
2 MÖOJEN, S. M. P. Caracterizando os Transtornos de Aprendizagem. In: BASSOLS, A. M. S. e col. Saúde mental na escola: uma abordagem multidisciplinar. Porto Alegre: Editora Mediação, 2003.
3 AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4ª edição. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
4 http://www.nimh.nih.gov/publicat/learndis.htm

Fazendo a diferença… Perguntas que precisam ser respondidas

Com a chegada do final da jornada escolar, cresce a demanda nos consultórios, a ansiedade da família e a angústia da escola com aqueles alunos com dificuldades de aprendizagem. A falta de resposta da origem dessas dificuldades torna-se mais intrigante à medida que o ano vai terminando.

É importante ressaltar que o motivo de uma dificuldade de aprendizagem não é necessariamente uma situação pontual. As perguntas pairam no ambiente escolar e familiar – por que a criança/adolescente não aprende? É considerado inteligente mas não consegue atingir o mínimo esperado para sua série? Quais são as estratégias mais adequadas que devem ser orientadas à equipe escolar para aproveitar ao máximo o potencial de aprendizagem desse aluno?

Na experiência clínica, as dificuldades de aprendizagem (em sua maioria) não estão relacionadas à déficits cognitivos. Relato o caso de um adolescente de 15 anos que chegou com queixa de dificuldades de aprendizagem em geral, desmotivação e uma forte tendência à reprovação. A defasagem pedagógica era enorme e a angústia da escola e da família provocavam um alto nível de ansiedade, trazendo consequências desastrosas na vida desse adolescente. Após a avaliação, foi percebida uma dificuldade atencional extremamente significativa onde foi constatado um déficit de atenção e imediatamente tratado com medicação e intervenção cognitiva. Foi muito gratificante quando ele me relatou “parece que acordei para a vida. Foi a primeira vez que consegui entender o que o professor estava falando”.

Já entrevistando pais que descobriram que seu filho apresentava uma dificuldade no processamento visual (Síndrome de Irlen), percebemos que a vida passava a ser vista por outro ângulo. Isso não implicava na resolução total de problemas, mas mais um componente importante a ser aliviado, liberando os outros canais de aprendizagem e auxiliando para as outras intervenções multidisciplinares.

Quando conseguimos colaborar para amenizar o sofrimento de crianças/adolescente e até adultos, seja ela por avaliações, intervenções, orientações à família e escola, temos a sensação de que nosso papel vai além do conhecimento acadêmico (embora seja ele muito importante). Trata-se de uma crença de que o ser humano é modificável e que apesar das dificuldades, podemos ser surpreendidos com sua evolução. Somos mediadores de todo esse processo de busca por respostas. Felizmente não estamos sozinhos! Cada um em sua área, com seu conhecimento e dessa forma multidisciplinar, trabalhamos juntos para que alcancemos mais respostas para mais perguntas que virão na nossa jornada!

Suely Mesquita
Psicopedagoga Clínica e Institucional
Mestranda em Educação pela Universidade de Jaen – Espanha
Mediadora do PEI Standart e Básico – CBM SP e Instituto Feuerstein – Israel
Departamento dos Distúrbios de Aprendizagem Relacionados à Visão – Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães

Família-escola Parceria vital

A família é essencial para o desenvolvimento do indivíduo, independentemente da sua formação. É no meio familiar que o indivíduo tem seus primeiros contatos com o mundo externo e aprende os primeiros valores e hábitos. Tal convivência é fundamental para que a criança se insira no meio escolar sem problemas de relacionamento disciplinar, entre outros.

Para que uma criança aprenda é necessário que se respeitem várias integridades, como o desenvolvimento perceptivo-motor, perceptivo e cognitivo e a maturação neurobiológica, além de inúmeros aspectos psicossociais, como: oportunidade de experiências, exploração de objetos e brinquedos, assistência médica, nível cultural etc.

Quando a escola, o pai e a mãe falam a mesma língua e têm valores semelhantes, a criança aprende sem grandes conflitos e não joga a escola contra os pais e vice-versa.

Um passo importante para a construção de uma parceria entre a escola e a família é, sem dúvida, a identificação dessa como instituição educadora, tendo sempre o que transmitir e o que aprender. “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”, como afirmou Paulo Freire.

Para que a parceria dê certo, é preciso que haja respeito mútuo, o que favorece a confiança e demonstra competência de ambas as partes.

O sucesso e o fracasso acadêmico dividem-se em três variáveis interligadas: ambiental, psicológica e metodológica. O contexto ambiental engloba fatores relativos ao nível socioeconômico e suas relações com a ocupação e escolaridade dos pais, número de filhos etc. Os psicológico refere-se à organização familiar, ordem de nascimento dos filhos, nível de expectativa e as relações desses fatores são respostas como ansiedade, agressão, baixa autoestima, atitudes de desatenção, isolamento e não concentração. O metodológico diz respeito ao que é ensinado nas escolas e sua relação com valores como pertinência e significado, com o fator professor e como o processo de avaliação em suas várias acepções e modalidades.

A rigidez na sala de aula para crianças com dificuldades de aprendizagem é fatal. Para progredirem, tais estudantes devem ser encorajados a trabalhar ao seu próprio modo. Se forem colocados com um professor inflexível, ou que usa materiais e métodos inapropriados às suas necessidades, serão reprovados.

As dificuldades de aprendizagem aparecem quando a prática pedagógica diverge das necessidades dos alunos. Nesse aspecto, sendo a aprendizagem significativa para o aluno, esse se tornará menos rígido, mais flexível, menos bloqueado, isto é, perceberá mais seus sentimentos, interesses, limitações e necessidades.

O estresse emocional também compromete a capacidade de aprendizagem das crianças. A ansiedade em relação a dinheiro ou mudanças de residência, a discórdia familiar ou doenças podem corroer a disposição de uma criança para confiar, assumir riscos e ser receptiva a novas situações que são importantes para o sucesso na escola.

É importante, pois, o estabelecimento de uma rotina na escola. É por meio dessa rotina que são identificadas as queixas comuns na primeira infância, que, em geral, são erroneamente confundidas, por desconhecimento, com agressividade, hiperatividade e desatenção. Esses diagnósticos, quando analisados com o devido cuidado, podem revelar dados importantíssimos e que demandam orientações da própria escola.

Uma das formas de prevenção é preparar o corpo docente para a prática dos jogos e atividades lúdicas, realizando principalmente, um aprofundamento sobre a importância do ato de brincar para o desenvolvimento infantil.

A sociedade urge por uma parceria de sucesso entre famílias e escolas, a fim de construir uma educação de qualidade, que possa promover o bem-estar de todos.

Só assim se poderá alcançar uma sociedade coerente, em que seus agentes conheçam e cumpram os seus papéis em todos os processos, sobretudo, no educacional, sem deixar de lado e o familiar e o social.

Izabel Guerra
Psicopedagoga e 
Screener da Síndrome de Irlen

Entenda os diferentes transtornos de aprendizagem

O aprendizado é um processo complexo, dinâmico, que resulta em modificações estruturais e funcionais permanentes no SNC (Sistema Nervoso Central). As modificações ocorrem a partir de um ato motor e perceptivo, que, elaborado no córtex cerebral, dá origem à cognição.

O transtorno de aprendizagem pode ser classificado levando em conta as funções cognitivas afetadas. A importância dada aos problemas relacionados à aprendizagem tem aumentado significativamente na atualidade e isso se deve em grande parte ao fato de que o sucesso do indivíduo está ligado ao bom desempenho escolar.

Para Adams (1973), as dificuldades específicas para a aprendizagem se referem àquela situação que ocorre com crianças que não conseguem um grau de adiantamento escolar compatível com sua capacidade cognitiva e que não apresentam problemas auditivos, visuais, sensoriais ou psicológicos importantes que possam explicar tais dificuldades. O transtorno de aprendizagem se traduz por um conjunto de sinais sintomatológicos que provocam uma série de perturbações no aprender da criança, interferindo no processo de aquisição e manutenção de informações de uma forma acentuada.

É importante estabelecer uma diferenciação entre o que é uma dificuldade de aprendizagem e o que é um quadro de transtorno de aprendizagem. Muitas crianças em fase escolar apresentam certas dificuldades em realizar uma tarefa, que podem surgir por diversos motivos, como problemas na proposta pedagógica, capacitação do professor, problemas familiares ou déficits cognitivos, entre outros.

 

O que são os transtornos de aprendizagem?

Compreendem uma inabilidade específica, como de leitura, escrita ou matemática, em indivíduos que apresentam resultados significativamente abaixo do esperado para seu nível de desenvolvimento, escolaridade e capacidade intelectual.

A real etiologia dos transtornos de aprendizagem ainda não foi esclarecida pelos cientistas, embora existam algumas hipóteses sobre suas causas. Sabe-se que sua etiologia é multifatorial, porém ainda são necessárias pesquisas para melhor identificar e elucidar essa questão.

Nos transtornos de aprendizagem, os padrões normais de aquisição de habilidades estão perturbados desde os estágios iniciais do desenvolvimento, ou seja, não são adquiridos, decorrentes de falta de estimulação adequada ou qualquer forma de traumatismo ou doença cerebral. Os transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares compreendem grupos de transtornos manifestados por comprometimentos específicos e significativos no aprendizado de habilidades escolares. Esse comprometimento no aprendizado não é resultado direto de outros transtornos, ainda que eles possam ocorrer simultaneamente.

Para identificar os transtornos de aprendizagem é preciso que o paciente seja submetido a uma avaliação multidisciplinar (neurologista, fonoaudiólogo, psicólogo, psicopedagogo e outros).

 

Quais são os transtornos de aprendizagem?

Tanto o CID – 10 como o DSM-IV apresentam basicamente três tipos de transtornos específicos: o transtorno da leitura, matemática e expressão da escrita. A caracterização geral desses transtornos de aprendizagem não difere muito entre os dois manuais;

 

Transtorno da leitura: é caracterizado por uma dificuldade específica em compreender palavras escritas. Dessa forma, pode-se afirmar que se trata de um transtorno específico das habilidades de leitura, em que foram eliminadas todas as outras causas.

O DSM-IV classifica como critérios diagnósticos para o Transtorno da Leitura:

• Rendimento da capacidade de leitura, como correção, velocidade ou compreensão da leitura, significativamente inferior à média para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

•A dificuldade de leitura apresentada pelo indivíduo interfere de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de leitura.

• Sob a presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de leitura excedem aquelas habitualmente a este associadas.

• A leitura oral se caracteriza por distorções, substituições ou omissões, e junto com a leitura silenciosa vem acompanhada por lentidão e erros na compreensão do texto.

 

Transtorno da matemática: também conhecido como discalculia, não é relacionado à ausência de habilidades matemáticas básicas, como contagem, e sim à forma com que a criança associa essas habilidades com o mundo que o cerca. A aquisição de conceitos matemáticos, bem como de outras atividades que exigem raciocínio, é afetada nesse transtorno, cuja baixa capacidade para manejar números e conceitos matemáticos não é originada por lesão ou outra causa orgânica. Falha na aquisição da capacidade e na habilidade de lidar com conceitos e símbolos matemáticos. Basicamente, a dificuldade está no reconhecimento do número e do raciocínio matemático.

O Transtorno da Matemática, segundo o DSM-IV, é caracterizado por:

• A capacidade matemática para a realização de operações aritméticas, cálculo e raciocínio matemático, encontra-se substancialmente inferior à média esperada para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

• As dificuldades da capacidade matemática apresentadas pelo indivíduo trazem prejuízos significativos em tarefas da vida diária que exigem tal habilidade.

• Em caso de presença de algum déficit sensorial, as dificuldades matemáticas excedem aquelas geralmente a este associadas.

• Diversas habilidades podem estar prejudicadas nesse transtorno, como as habilidades linguísticas (compreensão e nomeação de termos, operações ou conceitos matemáticos, e transposição de problemas escritos em símbolos matemáticos), perceptuais (reconhecimento de símbolos numéricos ou aritméticos, ou agrupamento de objetos em conjuntos), de atenção (copiar números ou cifras, observar sinais de operação), e matemáticas (dar sequência a etapas matemáticas, contar objetos e aprender tabuadas de multiplicação).

 

Transtorno da expressão escrita: refere-se apenas à ortografia ou caligrafia, na ausência de outras dificuldades da expressão escrita. Nesse transtorno, geralmente existe uma combinação de dificuldades na capacidade de compor textos escritos, evidenciada por erros de gramática e pontuação dentro das frases, má organização dos parágrafos, múltiplos erros ortográficos, na ausência de outros prejuízos na expressão escrita. Falha na aquisição da escrita; implica uma inabilidade ou diminuição no desenvolvimento da escrita.

O Transtorno da Expressão Escrita, de acordo com os critérios diagnósticos do DSM-IV, são:

• A capacidade das habilidades de expressão escrita encontram-se significativamente inferior à média para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

• A dificuldade na expressão escrita apresentada pelo indivíduo interfere de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de escrita, como escrever frases gramaticamente corretas e parágrafos organizados.

• Na presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de escrita excedem aquelas habitualmente a este associadas.

• O problema se caracteriza por dificuldades na composição de textos, erros de gramática e pontuação, má organização dos parágrafos, erros frequentes de ortografia e caligrafia precária.

O tratamento para os transtornos de aprendizagem é sempre multidisciplinar, focado nas áreas de maior dificuldade de seus portadores. É preciso que o paciente seja submetido a uma avaliação detalhada e, assim, será possível ajudá-lo a potencializar e criar estratégias para que obtenha um sucesso na área acadêmica.

Marina E. Alves Guimarães – Fonoaudióloga – CRFª7480/MG
Departamento de Distúrbios de Aprendizagem relacionados à visão
Hospital de Olhos – Dr. Ricardo Guimarães

Referncias Bibliogrficas:

ROTTA, Newra Telllechea , OHLWEILER, Lygia e RIESGO, Rudimar dos Santos. Transtornos de aprendizagem–abordagem neurobiológica e multidisciplinar Editora: Artmed . Porto Alegre, 2006.Capítulo 9

CIASCA, S. M. (org.) Distúrbios de aprendizagem: proposta de avaliação interdisciplinar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003, 220p.2

BRITO, Ana Teresa Brandão de Oliveira. Capítulo: Os Distúrbios de Aprendizagem e os Distúrbios Específicos de Leitura e da Escrita – Jaime Luiz Zorzi – Editora Pulso: São José dos Campos, 2005.

POPPOVIC, Ana Maria Alfabetização: disfunção psiconeurológica, 3. ed., São Paulo, Vetor Editora Psicopedagógica Ltda., 1968.

VALLET, Robert E. Tratamento de Distúrbios de Aprendizagem: Manual de Programas Psicoeducacionais. (Coord. da Editora Brasileira Leopoldo A. de Oliveira Neto), São Paulo, EDU/EDUSP, 1977.

MÖOJEN, Sônia Maria Pallaoro Caracterizando os Transtornos de Aprendizagem.In: BASSOLS, Ana Margareth Siqueira e col. Saúde mental na escola: uma abordagem multidisciplinar. Porto Alegre: Editora Mediação, 2003.