Rua da Paisagem, 220 – Vila da Serra BH / MG

Rua da Paisagem, 220 – Vila da Serra BH / MG

Artigos

Fazendo a diferença… Perguntas que precisam ser respondidas

Com a chegada do final da jornada escolar, cresce a demanda nos consultórios, a ansiedade da família e a angústia da escola com aqueles alunos com dificuldades de aprendizagem. A falta de resposta da origem dessas dificuldades torna-se mais intrigante à medida que o ano vai terminando.

É importante ressaltar que o motivo de uma dificuldade de aprendizagem não é necessariamente uma situação pontual. As perguntas pairam no ambiente escolar e familiar – por que a criança/adolescente não aprende? É considerado inteligente mas não consegue atingir o mínimo esperado para sua série? Quais são as estratégias mais adequadas que devem ser orientadas à equipe escolar para aproveitar ao máximo o potencial de aprendizagem desse aluno?

Na experiência clínica, as dificuldades de aprendizagem (em sua maioria) não estão relacionadas à déficits cognitivos. Relato o caso de um adolescente de 15 anos que chegou com queixa de dificuldades de aprendizagem em geral, desmotivação e uma forte tendência à reprovação. A defasagem pedagógica era enorme e a angústia da escola e da família provocavam um alto nível de ansiedade, trazendo consequências desastrosas na vida desse adolescente. Após a avaliação, foi percebida uma dificuldade atencional extremamente significativa onde foi constatado um déficit de atenção e imediatamente tratado com medicação e intervenção cognitiva. Foi muito gratificante quando ele me relatou “parece que acordei para a vida. Foi a primeira vez que consegui entender o que o professor estava falando”.

Já entrevistando pais que descobriram que seu filho apresentava uma dificuldade no processamento visual (Síndrome de Irlen), percebemos que a vida passava a ser vista por outro ângulo. Isso não implicava na resolução total de problemas, mas mais um componente importante a ser aliviado, liberando os outros canais de aprendizagem e auxiliando para as outras intervenções multidisciplinares.

Quando conseguimos colaborar para amenizar o sofrimento de crianças/adolescente e até adultos, seja ela por avaliações, intervenções, orientações à família e escola, temos a sensação de que nosso papel vai além do conhecimento acadêmico (embora seja ele muito importante). Trata-se de uma crença de que o ser humano é modificável e que apesar das dificuldades, podemos ser surpreendidos com sua evolução. Somos mediadores de todo esse processo de busca por respostas. Felizmente não estamos sozinhos! Cada um em sua área, com seu conhecimento e dessa forma multidisciplinar, trabalhamos juntos para que alcancemos mais respostas para mais perguntas que virão na nossa jornada!

Suely Mesquita
Psicopedagoga Clínica e Institucional
Mestranda em Educação pela Universidade de Jaen – Espanha
Mediadora do PEI Standart e Básico – CBM SP e Instituto Feuerstein – Israel
Departamento dos Distúrbios de Aprendizagem Relacionados à Visão – Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães

Família-escola Parceria vital

A família é essencial para o desenvolvimento do indivíduo, independentemente da sua formação. É no meio familiar que o indivíduo tem seus primeiros contatos com o mundo externo e aprende os primeiros valores e hábitos. Tal convivência é fundamental para que a criança se insira no meio escolar sem problemas de relacionamento disciplinar, entre outros.

Para que uma criança aprenda é necessário que se respeitem várias integridades, como o desenvolvimento perceptivo-motor, perceptivo e cognitivo e a maturação neurobiológica, além de inúmeros aspectos psicossociais, como: oportunidade de experiências, exploração de objetos e brinquedos, assistência médica, nível cultural etc.

Quando a escola, o pai e a mãe falam a mesma língua e têm valores semelhantes, a criança aprende sem grandes conflitos e não joga a escola contra os pais e vice-versa.

Um passo importante para a construção de uma parceria entre a escola e a família é, sem dúvida, a identificação dessa como instituição educadora, tendo sempre o que transmitir e o que aprender. “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”, como afirmou Paulo Freire.

Para que a parceria dê certo, é preciso que haja respeito mútuo, o que favorece a confiança e demonstra competência de ambas as partes.

O sucesso e o fracasso acadêmico dividem-se em três variáveis interligadas: ambiental, psicológica e metodológica. O contexto ambiental engloba fatores relativos ao nível socioeconômico e suas relações com a ocupação e escolaridade dos pais, número de filhos etc. Os psicológico refere-se à organização familiar, ordem de nascimento dos filhos, nível de expectativa e as relações desses fatores são respostas como ansiedade, agressão, baixa autoestima, atitudes de desatenção, isolamento e não concentração. O metodológico diz respeito ao que é ensinado nas escolas e sua relação com valores como pertinência e significado, com o fator professor e como o processo de avaliação em suas várias acepções e modalidades.

A rigidez na sala de aula para crianças com dificuldades de aprendizagem é fatal. Para progredirem, tais estudantes devem ser encorajados a trabalhar ao seu próprio modo. Se forem colocados com um professor inflexível, ou que usa materiais e métodos inapropriados às suas necessidades, serão reprovados.

As dificuldades de aprendizagem aparecem quando a prática pedagógica diverge das necessidades dos alunos. Nesse aspecto, sendo a aprendizagem significativa para o aluno, esse se tornará menos rígido, mais flexível, menos bloqueado, isto é, perceberá mais seus sentimentos, interesses, limitações e necessidades.

O estresse emocional também compromete a capacidade de aprendizagem das crianças. A ansiedade em relação a dinheiro ou mudanças de residência, a discórdia familiar ou doenças podem corroer a disposição de uma criança para confiar, assumir riscos e ser receptiva a novas situações que são importantes para o sucesso na escola.

É importante, pois, o estabelecimento de uma rotina na escola. É por meio dessa rotina que são identificadas as queixas comuns na primeira infância, que, em geral, são erroneamente confundidas, por desconhecimento, com agressividade, hiperatividade e desatenção. Esses diagnósticos, quando analisados com o devido cuidado, podem revelar dados importantíssimos e que demandam orientações da própria escola.

Uma das formas de prevenção é preparar o corpo docente para a prática dos jogos e atividades lúdicas, realizando principalmente, um aprofundamento sobre a importância do ato de brincar para o desenvolvimento infantil.

A sociedade urge por uma parceria de sucesso entre famílias e escolas, a fim de construir uma educação de qualidade, que possa promover o bem-estar de todos.

Só assim se poderá alcançar uma sociedade coerente, em que seus agentes conheçam e cumpram os seus papéis em todos os processos, sobretudo, no educacional, sem deixar de lado e o familiar e o social.

Izabel Guerra
Psicopedagoga e 
Screener da Síndrome de Irlen

Entenda os diferentes transtornos de aprendizagem

O aprendizado é um processo complexo, dinâmico, que resulta em modificações estruturais e funcionais permanentes no SNC (Sistema Nervoso Central). As modificações ocorrem a partir de um ato motor e perceptivo, que, elaborado no córtex cerebral, dá origem à cognição.

O transtorno de aprendizagem pode ser classificado levando em conta as funções cognitivas afetadas. A importância dada aos problemas relacionados à aprendizagem tem aumentado significativamente na atualidade e isso se deve em grande parte ao fato de que o sucesso do indivíduo está ligado ao bom desempenho escolar.

Para Adams (1973), as dificuldades específicas para a aprendizagem se referem àquela situação que ocorre com crianças que não conseguem um grau de adiantamento escolar compatível com sua capacidade cognitiva e que não apresentam problemas auditivos, visuais, sensoriais ou psicológicos importantes que possam explicar tais dificuldades. O transtorno de aprendizagem se traduz por um conjunto de sinais sintomatológicos que provocam uma série de perturbações no aprender da criança, interferindo no processo de aquisição e manutenção de informações de uma forma acentuada.

É importante estabelecer uma diferenciação entre o que é uma dificuldade de aprendizagem e o que é um quadro de transtorno de aprendizagem. Muitas crianças em fase escolar apresentam certas dificuldades em realizar uma tarefa, que podem surgir por diversos motivos, como problemas na proposta pedagógica, capacitação do professor, problemas familiares ou déficits cognitivos, entre outros.

 

O que são os transtornos de aprendizagem?

Compreendem uma inabilidade específica, como de leitura, escrita ou matemática, em indivíduos que apresentam resultados significativamente abaixo do esperado para seu nível de desenvolvimento, escolaridade e capacidade intelectual.

A real etiologia dos transtornos de aprendizagem ainda não foi esclarecida pelos cientistas, embora existam algumas hipóteses sobre suas causas. Sabe-se que sua etiologia é multifatorial, porém ainda são necessárias pesquisas para melhor identificar e elucidar essa questão.

Nos transtornos de aprendizagem, os padrões normais de aquisição de habilidades estão perturbados desde os estágios iniciais do desenvolvimento, ou seja, não são adquiridos, decorrentes de falta de estimulação adequada ou qualquer forma de traumatismo ou doença cerebral. Os transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares compreendem grupos de transtornos manifestados por comprometimentos específicos e significativos no aprendizado de habilidades escolares. Esse comprometimento no aprendizado não é resultado direto de outros transtornos, ainda que eles possam ocorrer simultaneamente.

Para identificar os transtornos de aprendizagem é preciso que o paciente seja submetido a uma avaliação multidisciplinar (neurologista, fonoaudiólogo, psicólogo, psicopedagogo e outros).

 

Quais são os transtornos de aprendizagem?

Tanto o CID – 10 como o DSM-IV apresentam basicamente três tipos de transtornos específicos: o transtorno da leitura, matemática e expressão da escrita. A caracterização geral desses transtornos de aprendizagem não difere muito entre os dois manuais;

 

Transtorno da leitura: é caracterizado por uma dificuldade específica em compreender palavras escritas. Dessa forma, pode-se afirmar que se trata de um transtorno específico das habilidades de leitura, em que foram eliminadas todas as outras causas.

O DSM-IV classifica como critérios diagnósticos para o Transtorno da Leitura:

• Rendimento da capacidade de leitura, como correção, velocidade ou compreensão da leitura, significativamente inferior à média para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

•A dificuldade de leitura apresentada pelo indivíduo interfere de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de leitura.

• Sob a presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de leitura excedem aquelas habitualmente a este associadas.

• A leitura oral se caracteriza por distorções, substituições ou omissões, e junto com a leitura silenciosa vem acompanhada por lentidão e erros na compreensão do texto.

 

Transtorno da matemática: também conhecido como discalculia, não é relacionado à ausência de habilidades matemáticas básicas, como contagem, e sim à forma com que a criança associa essas habilidades com o mundo que o cerca. A aquisição de conceitos matemáticos, bem como de outras atividades que exigem raciocínio, é afetada nesse transtorno, cuja baixa capacidade para manejar números e conceitos matemáticos não é originada por lesão ou outra causa orgânica. Falha na aquisição da capacidade e na habilidade de lidar com conceitos e símbolos matemáticos. Basicamente, a dificuldade está no reconhecimento do número e do raciocínio matemático.

O Transtorno da Matemática, segundo o DSM-IV, é caracterizado por:

• A capacidade matemática para a realização de operações aritméticas, cálculo e raciocínio matemático, encontra-se substancialmente inferior à média esperada para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

• As dificuldades da capacidade matemática apresentadas pelo indivíduo trazem prejuízos significativos em tarefas da vida diária que exigem tal habilidade.

• Em caso de presença de algum déficit sensorial, as dificuldades matemáticas excedem aquelas geralmente a este associadas.

• Diversas habilidades podem estar prejudicadas nesse transtorno, como as habilidades linguísticas (compreensão e nomeação de termos, operações ou conceitos matemáticos, e transposição de problemas escritos em símbolos matemáticos), perceptuais (reconhecimento de símbolos numéricos ou aritméticos, ou agrupamento de objetos em conjuntos), de atenção (copiar números ou cifras, observar sinais de operação), e matemáticas (dar sequência a etapas matemáticas, contar objetos e aprender tabuadas de multiplicação).

 

Transtorno da expressão escrita: refere-se apenas à ortografia ou caligrafia, na ausência de outras dificuldades da expressão escrita. Nesse transtorno, geralmente existe uma combinação de dificuldades na capacidade de compor textos escritos, evidenciada por erros de gramática e pontuação dentro das frases, má organização dos parágrafos, múltiplos erros ortográficos, na ausência de outros prejuízos na expressão escrita. Falha na aquisição da escrita; implica uma inabilidade ou diminuição no desenvolvimento da escrita.

O Transtorno da Expressão Escrita, de acordo com os critérios diagnósticos do DSM-IV, são:

• A capacidade das habilidades de expressão escrita encontram-se significativamente inferior à média para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

• A dificuldade na expressão escrita apresentada pelo indivíduo interfere de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de escrita, como escrever frases gramaticamente corretas e parágrafos organizados.

• Na presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de escrita excedem aquelas habitualmente a este associadas.

• O problema se caracteriza por dificuldades na composição de textos, erros de gramática e pontuação, má organização dos parágrafos, erros frequentes de ortografia e caligrafia precária.

O tratamento para os transtornos de aprendizagem é sempre multidisciplinar, focado nas áreas de maior dificuldade de seus portadores. É preciso que o paciente seja submetido a uma avaliação detalhada e, assim, será possível ajudá-lo a potencializar e criar estratégias para que obtenha um sucesso na área acadêmica.

Marina E. Alves Guimarães – Fonoaudióloga – CRFª7480/MG
Departamento de Distúrbios de Aprendizagem relacionados à visão
Hospital de Olhos – Dr. Ricardo Guimarães

Referncias Bibliogrficas:

ROTTA, Newra Telllechea , OHLWEILER, Lygia e RIESGO, Rudimar dos Santos. Transtornos de aprendizagem–abordagem neurobiológica e multidisciplinar Editora: Artmed . Porto Alegre, 2006.Capítulo 9

CIASCA, S. M. (org.) Distúrbios de aprendizagem: proposta de avaliação interdisciplinar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003, 220p.2

BRITO, Ana Teresa Brandão de Oliveira. Capítulo: Os Distúrbios de Aprendizagem e os Distúrbios Específicos de Leitura e da Escrita – Jaime Luiz Zorzi – Editora Pulso: São José dos Campos, 2005.

POPPOVIC, Ana Maria Alfabetização: disfunção psiconeurológica, 3. ed., São Paulo, Vetor Editora Psicopedagógica Ltda., 1968.

VALLET, Robert E. Tratamento de Distúrbios de Aprendizagem: Manual de Programas Psicoeducacionais. (Coord. da Editora Brasileira Leopoldo A. de Oliveira Neto), São Paulo, EDU/EDUSP, 1977.

MÖOJEN, Sônia Maria Pallaoro Caracterizando os Transtornos de Aprendizagem.In: BASSOLS, Ana Margareth Siqueira e col. Saúde mental na escola: uma abordagem multidisciplinar. Porto Alegre: Editora Mediação, 2003.

 

Educando o Gestor: a gestão educacional e o convívio com os distúrbios de aprendizagem

As melhores escolas fazem constantes investimentos em infra-estrutura, metodologia e qualificação de professores. Mesmo atingindo todas as metas deste aprimoramento técnico, cerca de 15% dos alunos não conseguirão obter um bom aproveitamento. Esta porcentagem são os portadores de “Transtornos de Aprendizado”, objetos da atenção de especialistas em saúde e educação em todo o mundo. A maior parte dos portadores destes distúrbios tem sua causa associada à visão, freqüentemente denominada Dislexia ou Dislexia de Leitura.

O termo dislexia foi reportado pela primeira vez há mais de um século pelo oftalmologista alemão, Rudolf Berlin, que observara distorções perceptivas em crianças que não conseguem reconhecer ou compreender palavras impressas. A Dislexia recebe a atenção de vários profissionais de apoio, entre eles médicos, psicólogos, pedagogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais o que gera uma múltiplas classificações, abordagens terapêuticas, suporte educacional e familiar emprestada à Dislexia de acordo com o foco atuação de cada profissional.

O custo da Dislexia para o indivíduo, escola, família e a sociedade é enorme. A criança disléxica se torna frustrada com sua incapacidade em acompanhar seus colegas na leitura e nos exercícios de classe e de casa. O portador de distúrbio de aprendizagem é freqüentemente agredido por tropeçar em suas dificuldades (muitas vezes caricatas), não raro é criticado e punido pelo próprio professor, que confunde a dificuldade com falta de interesse. È sabido hoje que estas crianças são as que buscam com maior freqüência o convívio com más companhias, não raro se encaminham para as drogas e envolvem-se em acidentes com maior freqüência. Dois estudos nos EUA e um na Inglaterra feitos na população prisional mostraram uma incidência de 80% de achados de dislexia. Curiosamente outro estudo mostrou uma incidência de 50% de uma determinada população de milionários e empresários bem sucedidos. A conclusão é que o disléxico é diferente, dotado de grande capacidade e provavelmente a escola e o professor são os agentes mais importantes na transformação deste jovem em um cidadão bandido ou em um cidadão produtivo e bom.

Na família o disléxico representa um fardo pelas despesas adicionais e freqüentemente um elemento desestabilizador quando o quadro compromete sua sociabilidade. Para a escola o ônus vem no comportamento anti-social e baixo desempenho, que compromete índices de eficiência do educador e pelo custo que as exceções de tratamento que a legislação obriga a escola a dispensar ao disléxico.

Diante da aparente complexidade do problema, não raramente a postura do Gestor de Educação em relação ao problema é passiva permitindo que todas as práticas recomendadas pelo profissional sejam adotadas, buscando adaptar a escola às múltiplas técnicas e abordagens. È de se esperar que a atitude de obediência muitas vezes conflite com a metodologia e rotina da escola. Quando o Gestor compreende o problema ele é capaz de contribuir na criação de programas de apoio aos profissionais especializados, gerando sinergia com conseqüentes benefícios para o aluno, para o profissional e para a própria escola. Em uma segunda etapa é possível uma atitude ainda mais elaborada de gestão, criando junto com os profissionais de apoio políticas institucionais, que transformarão um problema em vantagem estratégica.

Como sair de uma posição passiva e de impotência diante de um problema que não consegue consenso nem mesmo entre os especialistas para uma atitude ativa de compreensão e gerência, orientando, coordenando e participando da solução?

Não há proposta de solução mágica para um problema tão antigo e tão complexo. Assim como não teremos solução antes da compreensão do problema. Mas ela é simples, precisamos primeiro compreender que a Dislexia é na realidade uma Síndrome única, muito heterogênea, com manifestações múltiplas (afetando principalmente o sistema visual e auditivo) e de intensidade variável.

Ao Gestor cabe a responsabilidade de conhecer o problema qualitativa e quantitativamente e seu impacto na sua escola. Só então ele, em trabalho com os profissionais de apoio já envolvidos na abordagem da dislexia, acumulará conhecimento e experiência que lhe servirão de base na tomada de decisões. Dessa maneira, poderá sair da atitude passiva e obediente para adotar uma atitude inicialmente colaborativa e, posteriormente, gerencial e se desejar, em seqüência, de liderança.

É um caminho a ser percorrido que começa com muita simplicidade e com elementos básicos da aprendizagem como a avaliação das habilidades sensoriais e, especialmente, visual e auditiva de cada aluno. Porém, não há mudança possível se não for precedida da EDUCAÇÃO DOS EDUCADORES.

O objetivo principal do curso EDUCANDO O GESTOR, sobre os “Transtornos de Aprendizagem relacionados à Visão”, é fazer esta introdução sobre a Dislexia, desmistificar o distúrbio, mostrar sua importância sobre a capacidade de aprender e sobre o comportamento do aluno e sugerir abordagens ao gestor educacional. Este conhecimento dará ao Gestor a oportunidade de participar dos esforços feitos pelos profissionais que cuidam da dislexia na escola e permitirá a ele aumentar sua harmonia com estes educadores e, posteriormente, evoluir para uma atitude gerencial e estratégica.

Dr. Ricardo Guimarães Oftalmologista, diretor do Hospital de Olhos e presidente da Fundação Hospital de Olhos.

E a família, como vai?

Quando a dificuldade de aprendizagem entra em cena no contexto familiar os seus membros se deparam com uma nova circunstância fazendo parte de seu dia a dia. Consequentemente, podemos esperar que haja uma modificação dos papéis desempenhados por seus elementos. A família passará por mudanças diante dessa nova situação.

Antes de tudo, é necessário que pais, professores, educadores e quem mais estiver envolvido neste contexto esteja ciente de que muitas crianças apresentam alguma dificuldade no processo complexo que é a aprendizagem. Shaywitz (2006) ressalta que a dislexia, por exemplo, atinge uma em cada cinco crianças. Portanto, é fundamental a atenção dos pais no momento de identificar os sinais que indicam que uma criança apresenta, de fato, algum tipo de dificuldade de aprendizagem, e não que seja preguiçosa, pouco inteligente ou mal comportada. Trata-se de um quadro que atinge um grande número de crianças, e, portanto, de famílias que vivem situação semelhante.

As famílias lidam de maneiras diferentes com a dificuldade do filho e essas diferenças podem estar relacionadas com o momento atual que estão vivendo como, por exemplo, separação do casal, mudança de cidade, situação econômica da família, mudança de escola, entre outros. Também, como sua própria história de vida, ou seja, experiências vividas até então tais como o tipo de criação, direitos e deveres a serem cumpridos, crenças e valores.

Coelho (2006) considera a família como uma instituição, um grupo social, no nível funcional que contém regras de relação entre os seus elementos e cujas funções são desempenhadas no seu dia a dia e modificadas constantemente. Portanto, a família está sempre em processo de interação e as transformações nela ocorridas refletem mudanças de comportamento e mudanças nos papéis de seus membros.

O objetivo deste texto é mostrar de que forma a dificuldade de aprendizagem causa uma desorganização familiar e o quanto esta desorganização pode influenciar a criança e seus processos de aprendizagem.

Quando o primeiro contato com a família é feito, através de uma entrevista de anamnese, é observado que, além das queixas trazidas pelos pacientes relacionadas às dificuldades de aprendizagem (falta de concentração, dificuldades na leitura, Matemática, Português, troca e/ou omissão de letras, etc.), podem aparecer também outros sintomas como os emocionais que, em alguns casos, influenciam diretamente na questão do aprendizado.

Não é raro observarmos o choro de algumas mães, que procuram o melhor para seus filhos, mas que já não conseguem disfarçar o quanto estão afetadas pela dificuldade do mesmo. Elas assumem uma culpa sentindo-se responsáveis por esta situação.

O contrário também acontece. Alguns pais, logo no início da entrevista, cobram resultados de um tratamento que esperam ter, mas que nem sempre condiz com o tratamento que é oferecido enfatizando que o filho tem que receber o melhor. Antes mesmo do começo da conversa já questionam as intervenções e os resultados.

Ultimamente, muitos avôs e avós estão acompanhando e buscando ajuda para seus netos, assumindo essas crianças como seus filhos.

Estas atitudes afetam o comportamento das crianças, modificando seus sentimentos. Os papéis podem até sofrer algum tipo de alteração, mas não podem se misturar. De que adianta a mãe, ou o pai, ou até mesmo o professor fazer a tarefa escolar para a criança? Quem irá se beneficiar com isso?

O ideal seria que os pais oferecessem segurança e atenção aos seus filhos, para que a criança aceitasse melhor as frustrações que ocorrerão em muitas outras circunstâncias na vida. Porém, a realidade é que, em muitos casos, diante dessa nova circunstância, ocorre uma desorganização emocional, em que a ansiedade e a angústia também tomam conta dos pais e geram sentimentos neles que prejudicam ainda mais o momento de dificuldade vivido pelo filho. Se uma mãe chora, a outra se coloca de um modo autoritário, ou se o avô passa a exercer o papel de pai, compreendemos que são reações genuínas diante de um momento difícil também para os familiares. Porém, o que não pode ser deixado de lado é o efeito das lágrimas e destas atitudes sobre a família como um todo.

Além disso, é percebido, com freqüência,, que muitas famílias, por passarem por vários tipos de tratamento e tendo se frustrado em alguns deles, geram uma grande expectativa nos filhos a cada nova tentativa. Em contrapartida, os filhos se sentem pressionados a atenderem a expectativa de seus pais, o que gera ansiedade e causa mudanças no dia a dia familiar.

Em casos de dificuldade de aprendizagem, é sempre importante procurar ajuda profissional, para que se possa, além de trabalhar com a criança no sentido de favorecer seu processo de aprendizagem, compreender também os aspectos familiares e orientar os pais para que estimulem o desenvolvimento do filho de forma adequada.

A criança experimenta sentimentos de medo, nervosismo e cobrança, mas quando isso acontecer é o apoio e o equilíbrio da família que mais favorece a reorganização. A família é o lugar onde o indivíduo aprende a perceber o mundo, a se situar nele e a ter referências de proteção, de afeto, de pertencimento e de valores. Portanto, o vínculo familiar ajuda a criança a passar por momentos de dificuldades com mais segurança.

Marina Reis Botelho
Psicóloga Clínica – CRP 04/24476
Especialista em Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes Sociais
Departamento de Dislexia de Leitura do Hospital de Olhos de Minas Gerais

Referncias Bibliogrficas:

AUN, Juliana Gontijo; ESTEVES DE VASCONCELLOS, Maria José; COELHO, Sônia Vieira. Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes Sociais: Fundamentos teóricos e epistemológicos. 2 ed. Belo Horizonte: Ophicina de Arte e Prosa, 2006.

SHAYWITZ, Sally. Entendendo a dislexia: um novo e completo programa para todos os níveis de problemas de leitura. Porto Alegre: Artmed, 2006.

SNOWLING, Margaret; STACKHOUSE, Joy e cols. Dislexia, fala e linguagem: um manual do professional. Porto Alegre: Artmed, 2004.

ROTTA, Newra Tellechea; OHLWEILER, Lygia; RIESGO, Rudimar dos Santos. Transtornos da aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2006.
Suely Mesquita
Psicopedagoga Clínica e Institucional do Hospital de Olhos
Mediadora do PEI pelo ICELP – Israel e Professora Universitária.

Despertando o olhar para o conhecimento

Despertando o olhar para o conhecimento

O processo de alfabetização nas escolas não depende somente de um bom alfabetizador, mas, principalmente, de um educador com visão aberta para o conhecimento e para a possibilidade do desconhecido.

Em dezembro de 2009, recebemos uma mãe de nome Nina, na Instituição Centro de Vivências Despertar para Vida (CVDVIDA), em Vitória-ES, para uma avaliação psicopedagógica. Ela é professora do ensino fundamental e iniciou a anamnese com um depoimento angustiado: ___“Meu filho é medicado desde os 04 anos de idade, hoje ele tem 12 anos e nenhum médico me deu um diagnóstico que eu pudesse me sentir segura. Hoje, sinto nossa família doente. Meu filho encontra-se doente e eu não sei mais o que fazer para ajudá-lo. Ele tem notas abaixo da média na escola e atualmente manifesta comportamento agressivo. Eu tenho consciência de que meu filho não é isso que estão dizendo, mas não sei mais o que fazer”.

Marcamos a primeira sessão de avaliação com Arthur. Um menino franzino, ombros caídos, face pálida, linguagem curta e objetiva. Piscava os olhos o tempo todo e usava a mão na testa, querendo fazer sombra nos olhos. Não tivemos dúvida de qual seria o primeiro teste a ser realizado com Arthur: “Teste de Irlen”. Durante a aplicação do teste, a criança ficou muito incomodada. Foi com extremo tato que conseguimos dar continuidade o exame. No final da avaliação, com o uso dos overlays, detectamos o alívio imediato da criança para leitura do livro apresentado. Seu tom de voz e as feições do rosto tiveram melhora considerável. Chamamos a mãe para presenciar o fato. A mãe chorava de emoção, pois alegava que ela lia as tarefas para o Arthur e ele respondia oralmente. Ela nunca tinha presenciado a leitura dele daquele jeito. A Síndrome de Irlen, até o presente momento, era desconhecida por ela.

Para as psicopedagogas que acompanharam o caso foi um momento de muita emoção; presenciar uma cena de mãe e filho, com sentimentos angustiados e sofridos pela história de vida serem transformados em choro de alegria, oportunidade de conhecimento, capacidade de associação das idéias, e discernimento de fatos é essencialmente um privilégio. Mãe e filho, descobrindo o mundo com um outro olhar. Um cenário de revolução do conhecimento.

Em nossa prática profissional enquanto psicopedagogas, tivemos muitas vivências com vários pacientes. Crianças, adolescentes, adultos e idosos. O conhecimento sobre a Síndrome de Irlen, agrega valor ao nosso cotidiano profissional, criando mais um olhar – dentre tantos que nós exigimos verificar no exercício da avaliação de um paciente.

O Teste de Irlen é uma ferramenta necessária para a prática psicopedagógica na Instituição Centro de Vivências Despertar para Vida. É hora de despertarmos para um novo olhar dentro da realidade que se faz presente nas atitudes e comportamentos das pessoas que julgamos auxiliar.

Leila Landgraf
Psicopedagoga Clínica Institucional e Screener
Presidente do Centro de Vivências Despertar para Vida – CVDVIDA

 

Aquisição da Habilidade de Escrever

Ao participar do Curso de Dislexia com o Professor Vicente Martins, no Pré I Simpósio Nacional de Screeners, ocorrido no início de Outubro no Hospital de Olhos, senti-me na obrigação de realizar uma reflexão sobre o processo da escrita.

É comum ouvirmos questionamentos sobre a péssima qualidade das escritas das crianças de hoje: – “Por que antigamente todos tinham letra bonita e agora é esse caos?”

A resposta é muito simples, depois dos estudos sobre a “Psicogênese da Língua Escrita”, os educadores mal informados, descuidaram-se do processo de escrita, o qual envolve não apenas a instrumentação para a evolução do pensamento, em função da comunicação, mas exige também habilidades psicomotoras, as quais requerem uma complexidade maior no amadurecimento da musculatura, preparando assim o braço e os dedos para o ato de escrever, como ocorre na aquisição de toda habilidade motora.

De Ajuriaguerra a Emilia Ferreiro, todas as descobertas são válidas e muito fáceis de identificação na evolução infantil.

A Psicogênese da Língua Escrita é um fato, através dela podemos reconhecer a fase do desenvolvimento do letramento infantil, seja ela icônica, simbólica, silábica, silábica alfabética ou alfabética.

Para que a criança consiga se comunicar com legibilidade, precisamos atender a todos os aspectos de seu crescimento. O trabalho de conquista do Esquema Corporal começa no Maternal, desde o equilíbrio estático, dinâmico, educação de movimentos amplos, reforço dos movimentos de pinça, alongamento e “musculação”, de todo o corpo e neste caso especialmente dos membros superiores, a partir do ombro, até os dedos.

Para a criança escrever, ela precisa estar com o movimento de pinça muito bem definido, segurar corretamente o lápis, apoiando o braço na mesa, prevenindo-se assim de dores futuras, que tornam a escrita sofrida. Para isso a professora de Maternal deve oferece muita massinha, argila, rasgagem de papel, enrolagem de bolinhas, arremesso de bolas de jornal, transporte de materiais, pinturas e desenhos com vários instrumentos e sobre texturas diversas. Até o transporte da mochila da criança é benéfico para reforço dos músculos envolvidos na escrita.

Sabe-se que para desenhar um símbolo escrito, do nosso alfabeto, uma criança tem de ser capaz de reproduzir com clareza e traços bem definidos, um quadrado, um círculo e um losango.

Estas figuras básicas exigem do aluno habilidade para desenhar traços verticais, horizontais e circulares e inclinados. Estes últimos, só aparecem depois que a criança é capaz de cruzar a linha mediana do corpo. Antes disso, ela representa o traço inclinado, tombando o papel.

Mas é comum a criança fazer rabiscos e a mãe ou professores comentarem, -“Ele já escreve o seu nome”???…

A “CAIXA ALTA”, ou maiúscula de imprensa é muito simples, uma vez que exige apenas a representação das formas básicas, mas o processo é complexo. Primeiramente a criança desenha letras soltas no espaço. Depois ela adquire espaçamento (consegue escrever sem riscar uma letra por cima da outra). Em seguida a letra ganha proporcionalidade (todas de tamanho semelhante, o que deve ser no mínimo de dois centímetros, porque nesta fase a criança usa os dedos apenas para segurar o lápis e não pode movimentar o pulso, para não sentir dor, ela trabalha apenas com os músculos maiores que impulsionam o braço). Na última etapa a letra ganha alinhamento, indicando que a criança já é capaz de escrever na pauta.

Todavia o professor tem de estar atento para não deixar o aluno além do tempo necessário, escrevendo em caixa alta. A letra minúscula é muito importante, para que a criança perceba hastes ascendentes e descendentes, lado direito e esquerdo, e adquira os movimentos necessários que vão levá-la à escrita cursiva. A letra minúscula, porém deve seguir a pauta, as letras curtas (a, c, s, r, m, n, z, x, w e v) têm que ser do tamanho da pauta, as hastes ascendentes (l, b, d, t, h, k) tem de tocar a pauta de cima, e as descendentes (q, g, p, z, y), tocam a linha inferior.

A letra cursiva obedece ao mesmo processo evolutivo, e o alfabeto de Freeman é o mais indicado, porque foi comprovado que anatomicamente exige menos esforço da mão, a pessoa só levanta a mão do papel, depois de concluída a palavra. Na escrita cursiva, apenas os dedos se movem, o antebraço é apenas empurrado para direcionar os movimentos, o que garante ao escriba rapidez no ato de escrever, levando-o também a inclinar a letra. A folha deve fazer um ângulo de 30 graus com a beirada da mesa, facilitando assim o apoio na mesa.

Concluindo, para que o processo de aquisição da língua escrita se complete, é necessário que a criança saiba usá-la para se comunicar, de modo espontâneo. Além disso, sua letra tem de ter, espaçamento, proporção, legibilidade e rapidez. No caso da cursiva, os movimentos sejam realmente cursivos e só se interrompam no final da palavra.

É importante que a professora esteja atenta à habilidade de constância perceptiva, (leitura de qualquer tipo de letra), mas tratando-se de escrita caligráfica, o modelo de letra tem que ser sempre o mesmo. Mais tarde a criança poderá escolher seu estilo, mas enquanto aprende, a cópia tem de ser uma reprodução.

Durante a evolução da escrita é importante que se observe a percepção visual do aluno e a resposta ao processamento da imagem. A criança que processa de forma distorcida a imagem gráfica, com certeza terá respostas distorcidas ao escrever, principalmente na cópia, em que além de decodificar a palavra deverá reproduzi-la com fidelidade. Quando não ocorre essa fidelização pais e professores se questionam “como copiar errado”?

Esse, porém é um assunto para outra oportunidade, envolvendo a Ortografia.

Maria Christina Fonseca Penna é Screener e diretora pedagógica do Centro Educacional Ouro Preto (Ouro Preto-MG)

A inclusão de aluno com deficiências múltiplas em escola da Rede Particular de Ensino

A inclusão de aluno com deficiências múltiplas em escola da Rede Particular de Ensino

Há mais de quarenta anos trabalho em escolas particulares de ensino comum que incluem entre seus alunos alguns com necessidades especiais. Na escola atual temos alunos que apresentam diagnósticos que se enquadram na Síndrome de Asperger, Síndrome de Tourrette, Deficiência Intelectual, e vários Transtornos do Déficit de Atenção e Hiperatividade e outras dificuldades de aprendizagem. Realizamos um estudo minucioso destes alunos e preparamos um texto que foi trabalhado junto aos professores, com o objetivo de ajudá-los em sua práxis, tendo em vista que a nossa proposta é de turmas reduzidas para atendimento individualizado.

Por suas características particulares, resolvemos dedicar a um aluno. Este Estudo de Caso se transformou em uma monografia para conclusão de Curso de Especialização e, posteriormente, tornou-se uma dissertação de Mestrado.

Trata-se de um adolescente de 14 anos, aluno do 7º ano do Ensino Fundamental. Sua inclusão nesse grupo se deve à necessidade de que ele participe, junto com colegas da mesma idade, das atividades definidas para esse grupo classe.

Esse aluno apresenta deficiências múltiplas, sendo as mais evidentes uma Deficiência Intelectual, Hipotonia Muscular acentuada com Déficit Motor, comprometendo o Movimento Ocular Simétrico, Atemporalidade e Epilepsia, dentre outras dificuldades que interferem no seu processo de desenvolvimento. Por outro lado, trata-se de aluno carismático, aceito por to dos da comunidade escolar, embora alguns adultos demonstrem certo receio de trabalhar com ele. O aluno apresenta uma grande capacidade de relacionamento interpessoal, uma audição excelente, que o leva a se envolver prazerosamente com música.

Quando iniciamos o trabalho, o conceito de inclusão ainda estava duvidoso para nós. Agora já podemos afirmar que é possível incluir um aluno com deficiências múltiplas em uma escola comum.

É importante salientar que só a escola pode oferecer oportunidades de exercício de cidadania, de respeito a normas e aos outros. Horários, uniformes, atividades de classe e extra-classe, são valores que não podem ser abandonados no processo de inclusão, além dos conhecimentos adquiridos, assim como habilidades de convivência em grupo, a oportunidade de trabalhar com uma equipe de colegas em que a sua participação seja efetiva. Temos a ressaltar que as suas escolhas nas relações sociais e afetivas são fontes de prazer e de frustração, tornando-o mais forte para encarar desafios.

Os professores já conhecem melhor o aluno e se sentem mais seguros na elaboração das atividades. Cada disciplina tem características próprias, as orientações gerais que se encontram neste documento são apenas um início do que juntos ainda podemos fazer.

Quando escolhemos o sujeito para realizarmos o nosso trabalho sabíamos que teríamos um grande desafio pela frente, tendo em vista a complexidade do caso.

Hoje, podemos dizer que alcançamos nossos objetivos, embora ainda haja um longo caminho a percorrer, porém melhor ancorados na ciência. Se não fizemos tudo, com certeza dedicamos o máximo de nossos esforços.

Em conversa com a Dra. Márcia, descobrimos que o problema de visão convergente do aluno, que compromete sua percepção visual periférica, poderá ser avaliado no Hospital de Olhos, com um possível tratamento baseado no sistema proprioceptivo.

Uma pesquisa com seres humanos tende a evoluir conforme a evolução do sujeito, e assume as características desse crescimento.

Maria Christina Fonseca Penna é Screener e diretora pedagógica do Centro Educacional Ouro Preto (Ouro Preto-MG)

A importância do diagnóstico precoce dos Transtornos de Aprendizagem

A importância do diagnóstico precoce dos Transtornos de Aprendizagem

Nos últimos anos, a relevância da identificação precoce dos Transtornos de Aprendizagem tem se tornado maior, principalmente pelos professores, fonoaudiólogos, família, psicólogos e pedagogos. A incessante busca por novas avaliações e metodologias de reabilitação constitui um grande avanço no diagnóstico precoce e no manejo de indivíduos com risco de apresentar alterações de leitura e escrita.

Os motivos para se estabelecer um protocolo para a identificação e diagnóstico precoce das dificuldades de leitura e escrita são muitos e fáceis de enumerar. O elevado custo financeiro e pessoal de crianças com os transtornos de aprendizagem é uma questão que os pais e professores se identificam.

Ao se estabelecer um diagnóstico precoce de transtornos de aprendizagem, cria-se uma organização de atendimento e estruturação de apoio que visam suprir as necessidades e o desenvolvimento de estratégias compensatórias destes indivíduos. Segundo Muter (2004), “as necessidades das crianças podem ser tanto satisfeitas com precisão quanto manejadas com sensibilidade”.

Quando uma criança é identificada em situação de risco para transtornos de aprendizagem, na idade de 5 a 6 anos, o prognóstico é mais favorável e o processo de reabilitação mais rápido. Isso se relaciona ao fato destas crianças terem adquirido muito menos conteúdo acadêmico e, conseqüentemente, fazem menos compensação do que aquelas com diagnóstico tardio.

Preencher lacunas na habilidade leitora de uma criança com um atraso do desenvolvimento de um ano, na idade de 6 e 7 anos, é muito mais simples do que transpor estas mesmas barreiras em uma criança de 12 anos. Nesta última, compensar estes anos de perdidos no processo de leitura é demorado, sem mencionar a dificuldade para enfrentar as demandas curriculares das escolas.

Outro grande motivador para o diagnóstico precoce reside no fato de que quanto mais a criança é exposta a eventos frustrantes e traumáticos relacionados à vida acadêmica, os sentimentos de fracasso afetam adversamente sua motivação e receptividade. Assim, muitos professores e profissionais reconhecem que o trabalho com as crianças menores se desenvolve com mais facilidade, pois estas ainda não experimentaram estes sentimentos.

E por último temos a questão financeira, uma vez que, identificado precocemente estes alterações, o tratamento de reabilitação seguramente é mais barato, pois a necessidade das sessões é menor do que em casos de diagnóstico tardio.

Laura Niquini de Faria CRFa. 6143 – Fonoaudióloga do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães e Clínica Qualitá. Mestranda em Neurociências pela UFMG, consultora da Delfos Comunicação, COOPEN e do CEOP.

Síndrome de Irlen & Distúrbios de Processamento Visual pela Via Magnocelular – Por que ler pode ser tão difícil?

Profa. Dra. Marcia Reis Guimarães

Fundação Hospital de Olhos – Belo Horizonte, MG

 

Contextualização:

A oftalmologia dedica a maior parte de sua atenção ao estudo e correção dos erros refracionais, alterações da binocularidade e alinhamento entre os olhos e ao estudo de doenças oculares. Embora saibamos que os olhos têm a mesma origem embriológica e representem uma exteriorização do cérebro, pouca atenção ainda é dada a esta relação – devemos estar atentos ao fato de que a Visão é uma habilidade CEREBRAL e que o olho é um captador de estímulos luminosos, transformando-os em estímulos neurológicos  que serão  processados  em diversas sub-áreas  especializadas  a partir de uma área primária  ou V1  – visão envolve contraste, cor, movimento, direcionamento, texturas, tridimensionalidade, contextualização, memorização etc. E é por isto que  se  considera a visão como o sentido mais impactante do aprendizado escolar até os 12 anos de idade.

 

Uma boa visão depende de dois pontos fundamentais. A primeira é a condição anatômica, fisiológica e correlação óptica das estruturas dos nossos olhos, tais como a córnea e o cristalino, lentes que determinam o foco de luz exatamente sobre a retina ou da íris onde é feito o controle dinâmico da luminosidade. A segunda é a condição neurosensorial sobre onde e como os estímulos fotoquímicos são processados pelos sistemas integrados cerebrais gerando habilidades que se aprimoram progressivamente e com vigor especial nas diversas “janelas de oportunidade” onde o desenvolvimento de redes neuronais é mais favorecido.

 

Histórico:

No inicio da década de 80, o governo do estado da Califórnia, preocupado com a inserção no mercado de trabalho de mais de 12 000 adultos considerados analfabetos funcionais como forma de prevenção de criminalidade promoveu um estudo em larga escala desta população.   Á frente e coordenando este projeto, a profa. Dra. Helen Irlen, psicóloga educacional da Universidade da Califórnia em Long Beach, observou  que uma parcela   desta população apresentava  sintomas visuais acentuados que os impediam de adquirir e/ou manter uma leitura satisfatória  – este grupo recebeu atenção especial  por não se enquadrar no quadro clássico de dislexia e outras formas de transtornos conhecidas à época.  Após 3 anos de pesquisa sob financiamento federal  e como parte de seu trabalho à frente do Departamento de Psicologia, seu trabalho, resultados e  critérios visando o rastreamento e  identificação dos distúrbios visuais foi apresentado à  American Psychological Association  em 1983.

Inicialmente chamada de Síndrome da Sensibilidade Escotópica devido à fotofobia acentuada e manifesta preferência de seus portadores por ambientes com pouca luminosidade, a denominação considerava a hipótese de que as distorções estariam associadas a alterações nos bastonetes retinianos.

Embora haja evidências de que portadores de dificuldades à leitura tenham uma distribuição diferente de cones e bastonetes na retina e que estes usem mais informações derivadas da região parafoveal do que os leitores normais (Geiger et Lettvin, 1987, Grosser & Spafford,1989; Spafford & Grosser 1991; Solman, Dain et Keech, 1991) as teorias mais recentes indicam que as alterações ocorreriam na transmissão dos sinais dos sistemas Magno e Parvocelulares ao cérebro (Livingstone, Rosen, Durlane, Galaburda, 1991).

Atualmente o conjunto de sintomas apresentados por portadores desta disfunção perceptual é caracterizado como Síndrome de Irlen (SI). A existência da SI- como entidade clinica individualizada foi evidenciada por Muller (1985) e Adler & Atwood(1987).

 

Síndrome de Irlen    

Todos nós consideramos a leitura como uma habilidade natural e automática porque a realizamos sem esforço algum. Entretanto para muitas crianças e adultos  o ato de ler é um verdadeiro pesadelo e esta é a realidade para 10 a 15%  da população.  A leitura é a habilidade mais difícil e complexa que a espécie humana desenvolveu – e embora nos sejam dados muitos anos para aprender a falar  concedemos apenas um ano ou pouco mais para que nossas crianças aprendam a ler.  Ler não é intuitivo como falar e embora haja uma área  cortical para a linguagem, isto não ocorre na leitura.

Quando se lê, há estimulação da parte posterior do cérebro incluindo o lobo occipital que se ativa pelo formato das letras, o giro angular transcreve os grafemas em fonemas e a região de Wernicke acessa o significado. Nesta síntese, já se pode perceber como são complexos os processamentos neurológicos da leitura e linguagem e infelizmente não concedemos aos nossos alunos um tempo adequado para este aprendizado.

A verdade é que a pressão atual é muito maior: crianças na educação infantil (antiga pré-escola) já são cobradas quanto à capacidade de reconhecer uma letra, associar ao respectivo som e reconhece-las em palavras – não há duvidas de que estamos pedindo demais e muito cedo e muitas delas não estarão maturas para a complexidade exigida para a leitura.  As dificuldades podem afetar a auto imagem das crianças e seu interesse pelo aprendizado em geral tornando a mágica do acesso à escola um terrível pesadelo.  Por isto, é necessário identificar esta população e resgata-las precocemente antes que a leitura se transforme em dificuldade intransponível.

Excluindo-se os déficits mentais, cegueira, etc, são duas as principais causas especificas de aquisição da Leitura: a Dislexia  de desenvolvimento e a Síndrome de Irlen.  A Dislexia vem sendo amplamente discutida e já se tem amplo conhecimento da importância do apoio multidisciplinar que não raro será necessário ao longo de toda a vida de seu portador nas formas mais severas de manifestação.

É oportuno que professores e gestores tenham acesso às informações sobre a Síndrome de Irlen.

O reconhecimento da S.Irlen no Brasil se iniciou pelo trabalho realizado na Fundação Hospital de Olhos junto a crianças em idade escolar voltado para a prevenção e saúde visual.  O que intrigou os oftalmologistas era o fato de que uma parcela delas, NÃO CONSEGUIA APRENDER A LER, embora se apresentassem dentro da normalidade pelo exame de rotina bem detalhado (refracional, ortopico, etc). Eram espertas, inteligentes, participativas, expressavam-se bem durante os exames, mas não se saiam bem na leitura e havia queixas de fotofobia, prurido ocular, ardência, lacrimejamento e cansaço visual crescente, sonolência , perda da concentração, baixo rendimento escolar e a sensação de que o texto “ia ficando mais ofuscado, cansativo, com letras pareciam tremer  ou se agrupar fazendo com que perdessem a atenção e o local onde tentavam ler”.

Curiosamente estas dificuldades também apareciam ao copiar, no computador, ao olhar o quadro negro, na pratica de  esportes e até quando andavam de ônibus ou de carro levando-os a ter enjôos  e ainda relatavam  a ocorrencia de  pequenos acidentes,  esbarrações em  cadeiras, portas, deixando cair cadernos, pastas, copos, etc.

Este conjunto de sintomas que se manifesta de maneira completa ou parcial foi descrito ainda em 1983, pela psicóloga educacional e familiar Helen Irlen. Hoje é internacionalmente conhecido como Síndrome de Irlen.

A Síndrome de Irlen é uma alteração visuoperceptual, causada por um desequilíbrio da capacidade de adaptação à luz que produz alterações no córtex visual e déficits na leitura, tendo caráter hereditário e manifestando-se sob maior demanda de atenção visual, como leitura de texto ou trabalho no computador.¹ Por isto, o  exame oftalmológico dos suspeitos deve ir além dos problemas nos olhos e da acuidade visual ( Tabelas com letras de tamanhos decrescentes) feitos em condições estáticas – o exame investiga a oculomotricidade e a eficiência do processamento visual já em nível cerebral.

Para ler, movimentamos os olhos rápida e sincronizadamente envolvendo vários processos cognitivos multimodais – mal comparando, o olho seria o hardware e os déficits no processamento visual uma alteração no software.           

O quadro é composto 6 manifestações: fotofobia, problemas na resolução viso-espacial, dificuldades na manutenção do foco, estresse visual, alteração na percepção de profundidade e cefaleias aos esforços visuais prolongados².

Segundo os portadores, o brilho ou reflexo do papel branco contra o texto seja sob luz natural ou fluorescente³ causa irritabilidade, sensação de movimentação das letras que “pulsam, tremem, vibram, confluem ou desaparecem”4 e a leitura passa a ser fragmentada. Além disso, sentem-se inseguros ao dirigir, estacionar, tendo dificuldades com esportes com bola e ao usar  escadas rolantes.

A prevalência da S.I. é maior que a da própria Dislexia (estimada entre 3 a 6% da população). Entre bons leitores, está presente em 14% deles, entre maus leitores e portadores de deficits de aprendizagem, as porcentagens crescem para 17 a 46%.  É freqüente a co-associação com Déficits de Atenção e Hiperatividade. Nestes, o diagnóstico diferencial pré-intervenção é indispensável6.

Na S.I., ao contrário da Dislexia, não há alterações auditivas, da fala e linguagem.   A prolixidade, impulsividade, falta de autocontrole, agitação e hiperatividade dos TDAs e TDAHs merecerão intervenções medicas e/ou muldisciplinares.        

As intervenções identificam e neutralizam as faixas de luz mais hipersensibilizantes. Através de transparências de cores especificas, eliminam-se as distorções visuoperceptuais levando de imediato a uma leitura mais fluente e compreensível, caso o portador esteja alfabetizado.

As transparências são um Recurso Assistivo não invasivo, de baixo custo e alta resolutividade, que potencializam o efeito das intervenções multidisciplinares mesmo na própria dislexia, se houver déficits visuais envolvidos. (O custo aproximado de uma transparência é de 20 reais por aluno).

Os portadores da S.I.  não têm consciência de suas distorções pois estão habituados a  percebe-las sempre que lêem.  Por isto, pressupõem que isto ocorre em toda a população  –   e este fato explica  a frustração e baixa auto-estima geradas pela lentidão e esforço na leitura que  sentem enquanto que, para seus pares,  esta mesma atividade  é considerada  prazeirosa e natural. Estudos na população carcerária mostraram uma  incidência de 82% de portadores de S.I. 9,  demonstrando claramente a relação entre a exclusão social e a criminalidade.  Os lamentáveis e bem conhecidos efeitos psicossociais desta realidade são a agressividade, baixa escolaridade, desistência profissional e depressão. É ainda nesta situação preocupante que podem estar os milhares de candidatos ao ENEM sobrecarregados pela demanda de “sustentação da atenção à leitura prolongada”, cansaço visual progressivo e perda na compreensão.

O reconhecimento da S.I. pode ser feito por profissionais da saúde e da educação capacitados pelo Método Irlen,  aplicado em mais de 40 países. 8

A dependência da visão na aprendizagem é estimada em 80% e o screening, feito após exame oftalmológico; identifica a gravidade das distorções perceptuais quando presentes.

No Brasil, os oftalmologistas da Fundação Hospital de Olhos de Minas Gerais  cuja atuação esta voltada à promoção da saúde  visual e auditiva na escola  constavam que  crianças  e jovens atendidos  ao longo de seus 30 anos de atuação; ainda que  tivessem bom desenvolvimento neuropsicomotor e  acuidade visual normal  pelos exames oftalmológicos de rotina , sem  ambliopia,   estrabismo e outras patologias oculares;   podiam ainda assim  ter deficits de aprendizagem  por não conseguirem ler  satisfatoriamente.

Em 2005, iniciaram-se em Belo Horizonte, no Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães, os estudos brasileiros  na área, através de protocolos com grade de exames  mais amplos e respaldados em dados trazidos pela neurociência  – a   VISÃO  passou a ser avaliada também por suas habilidades cerebrais  e  termos como Processamento Visual, Neurovisão, Visão Cortical e Subcortical,  processamento espacial, temporal  e oculomotricidade passaram a  ser consideradas em portadores de  disturbios de aprendizagem  com exames voltados para a qualidade do Processamento Visual e não apenas do olho e da óptica ocular.

 

Atualmente, o diagnóstico da S.I requer avaliações multifuncionais, com ênfase na  dinâmica (oculomotricidade)  e o desempenho visual é posto à prova diante de condições de luminância variadas que desafiam a capacidade adaptativa de resposta e transmissão sensorial.

 

O que é Síndrome de Irlen?

A Síndrome de Irlen é uma disfunção visuoperceptual relacionada à exposição a certos tipos de iluminação, intensidade, comprimentos de onda e contraste e frequências espaciais que induzem dificuldades no processamento de informações requerendo maior exigência atencional e visual, como é o caso da leitura.  As dificuldades se devem principalmente a déficits no Processamento das informações visuais pela Via Magnocelular.

 

Os pacientes portadores da SI investem grande esforço em atividades de leitura devido a pouca eficiência e distorções que exigem adaptações visuais constantes pelo contraste do tipo figura-fundo, ou seja, ao contraste criado pelo texto impresso contra o papel branco o que lhe provoca a sensação de que o texto está sendo “engolido pelo branco à sua volta” reduzindo o tamanho das letras.

Este esforço visual gera fadiga, lentidão, desconforto, reduz a tolerância e tempo de exposição à atividade de leitura e compromete a manutenção de atenção, memorização e compreensão do texto.

Segundo Irlen, as dificuldades abrangem cinco áreas específicas e podem se manifestar em qualquer faixa etária sob intensidades variáveis de modo parcial ou conjunto.

A primeira manifestação se relaciona à fotofobia, geralmente relatada como percepção de brilho excessivo no papel que compete com o texto impresso desviando a atenção do leitor.  Esta fotossensibilidade extende-se a todos os aspectos da vida diária; quando há exposição direta à luz solar direta ou luzes fluorescentes, faróis de carros, spots de luz, ambientes como shoppings e supermercados, bancos, escolas e laboratórios entre muitos outros haverá desconforto.

Em geral, preferem ler à meia-luz, quase no escuro ou paradoxalmente reclamam que a luz está fraca à leitura.Outros comportamentos observados são as mudanças de posição para evitar o ofuscamento, tentativas de fazer sombra sobre o local, levando a mão à testa ou adotando um inseparável boné para diminuir a incidência de luz sobre o papel.  Na direção, sentem-se incomodados com brilhos no espelho retrovisor, luzes traseiras e de freio, reflexos dos carros à frente, enjoam e sentem-se incapazes de dirigir na chuva ou sob faróis altos que lhe provocam dores oculares intensas.

Em seguida, temos as dificuldades ligadas à resolução espacial, onde se observam o aparecimento de distorções perceptuais no texto, que produzem desfocamento, movimentação das letras que passam a tremer ou vibrar, se aglomeram ou se justapõem, invertem-se ou desaparecem, brilham, elevam-se do papel, produzem ondas ou mesmo redemoinhos na pagina com texto dentre muitas outras formas descritas pelos pacientes.  Em tais condições operacionais de leitura, entonação, pontuação e interpretação tornam-se inviáveis.

As distorções manifestam-se também durante a leitura de pautas musicais levando a dificuldades de interpretação de anotações, perda do local na partitura e preferência por tocar de ouvido, memorizando a partitura para não ter que lê-la ou progredindo pouco mesmo com praticas regulares.

A terceira área se refere a uma redução do alcance focal , com diminuição do numero de letras lidas a cada fixação.  Este fato leva à tendência para uma leitura fragmentada ou silábica das palavras, que são decodificadas parcialmente, dificultando o reconhecimento de pistas visuais necessárias à interpretação do significado do texto e a formação de um vocabulário visual adequado.

A manutenção da atenção visual ou foco gera dificuldades porque o texto tende a sumir ou se apresentar desfocado após um pequeno tempo de leitura.  Este fato gera a necessidade de seguir a linha com o dedo, perda de compreensão, necessidade de releituras, dificuldade de concentração e transposição de respostas para folhas de gabarito.

Cerca de 50 a 80% dos portadores da Síndrome de Irlen apresentam cefaléia em co-existência  às cinco manifestações supra descritas e não raro apresenta-se como queixa principal  em  pacientes com fotofobia e cansaço aos esforços visuais.

As cefaléias são uns dos principais motivos para consulta oftalmológica em pacientes jovens, ocorrendo em cerca de 8% dos casos.  Considera-se que hiperforias (eso ou exo) descompensadas poderiam ser um fator precipitador de enxaquecas; os quadros de  enxaqueca ou migrânea são também  freqüentes e podem acometer a faixa etária mais jovem,  razão pela qual a S. Irlen deve ser considerada entre os fatores etiológicos no extenso diagnóstico diferencial desta população nas clinicas oftalmológica, clinica  médica e neurológica.

Finalmente, o estresse visual se apresenta através de uma série de sinais (astenopia) que se revela pelo aumento do piscar, lacrimejamento, tendência a esfregar os olhos seguidamente e ainda de cobrir ou fechar um dos olhos, posições de cabeça aproximando-se ou se afastando do texto, olhos vermelhos, irritabilidade crescente.

Com freqüência os portadores manifestam sinais de agitação motora e demanda por interrupções e paradas para descanso durante leitura que se prolongue além de 10 ou 15 minutos, ou menos, dependendo das características do texto.  Há uma tendência em distrair-se em aulas e conferências, “sonhar acordado” buscando o alivio ao estresse visual crescente.

Outros componentes são as dificuldades com a percepção de profundidade, evidenciados em atividades da vida diária como descer uma escada, pegar um objeto na carteira, alcançar uma bola, acompanhar o movimento de uma bola durante uma partida esportiva e visualizar o jogador ao mesmo tempo, pular corda, etc. Adultos relatam dificuldades em estacionar, em manobras mudando de faixa ou fazendo conversões à direita ou esquerda e também em calcular a distância do carro à frente aproximando-se demais ou  mantendo distância excessiva por insegurança.

A prevalência da SMI em diversas populações foi investigada por vários autores.  Segundo Muller (1985), esta atinge 74% dos adultos com problemas de leitura e 15% daqueles considerados leitores habituais ou acima da média; neste ultimo grupo é comum a adoção de estratégias compensatórias visando minimizar o desconforto visual que os acompanha nestas tarefas. Neste grupo, com escolaridade de nível técnico ou superior, é freqüente a preferência por relatórios ditados, discussões em grupo, preferência por sinopses em lugar de textos completos, dificuldades em ouvir e anotar simultaneamente, raras leituras integrais de livros, mesmo os de alto interesse pessoal. Em leitores de series normais a incidência varia entre 24,8 % ( Robinson et all, 1985) a 45% ( Fisher & Miller, 1987).

Em populações onde há evidentes déficits na aquisição de leitura, a incidência variou de 46 a 50% (Robinson & Miles,1987), Whiting (1986), Adler &Atwood (1987) e Irlen (1983).  Em nossa instituição a incidência foi de 83%, justificada pelo fato de ser um serviço de referência e, portanto direcionado para o atendimento deste tipo de dificuldade (pesquisa apresentada no congresso de Neurociências UFMG 2010).

Niquini (2011) encontrou uma prevalência de 17,5% de portadores da SMI em escola da rede publica municipal da cidade de Belo Horizonte entre 450 alunos.  Como parte de tese de mestrado em Neurociências pela UFMG, foram analisados ainda o desempenho à leitura pré e pós intervenção com  lâminas de bloqueio espectral, ocorrendo significativa melhora de parâmetros como fluência, compreensão, eficiência leitora e movimentação sacádica.

É importante enfatizar que a síndrome pode coexistir com outras dificuldades no aprendizado e, portanto  a intervenção para a S.I. não elimina a necessidade de apoio multidisciplinar como o psicopedagógico para reabilitação dos conteúdos educacionais, os  fonológicos para os déficits auditivos, da terapia ocupacional  quando há alterações na coordenação visuomotora e os medicamentosos, sob orientação neuropsiquiátrica . Com freqüência, uma vez neutralizada a disfotopsia e distorções visuais, seus portadores melhoram progressivamente na leitura e atividades escolares, e vêem reduzida a necessidade de medicamentos voltados para distúrbios atencionais. Por esta razão, muitos colegas neurologistas que trabalham em parceria conosco tem preferido aguardar a resposta às intervenções visuais antes da prescrição medicamentosa habitualmente adotada neste grupo de pacientes.

Mesmo entre os colegas sem interesse direto na área de visão e aprendizagem, os novos conceitos e inter-relações da oftalmologia e neurociências poderão ser úteis para o encaminhamento correto e precoce dos casos suspeitos de déficits na eficiência do processamento visual.

 

Qual a relação entre os Processamentos Visual e Fonológico em disturbios de aprendizagem ? E na Dislexia ?

Hoje, à luz das contribuições da neurociência já esta bem estabelecida a influencia do processamento visual na leitura e aprendizagem. Inclusive, diversos autores, baseados em evidencias cientificas vem questionando se a própria dislexia não teria como causa básica, um déficit visual atencional e deste modo a tradicional decodificação fônica passaria a representar uma etapa subseqüente no processamento da leitura. Isto explicaria porque parte dos disléxicos após anos de intervenções fonoaudiológicas não respondem  satisfatoriamente à reabilitação. E também porque em casos onde o enfoque ortográfico (visual) precede o fônico, a aquisição da leitur      a é muitas vezes feita de forma mais rápida e proficiente.

Isto explicaria , segundo alguns autores, porque as crianças que aprendem o alfabeto antes de serem introduzidas à leitura são melhores leitoras do que aquelas que aprendem sons e letras antes do ensino formal de leitura. A inversão e omissão de letras são freqüentes em disléxicos – a sensibilidade ao sequenciamento espacial é um dos pontos preditivos na qualidade de leitura futura tanto em crianças como adultos. Erros de leitura em palavras inventadas ou inexistentes não são explicados por déficits fonológicos.

Há relatos de pacientes com lesão cerebral que mantêm boa consciência fonológica, mas mostram dificuldades com palavras inventadas.

Diante destas evidencias e questionamentos, faz-se necessária uma conscientização por parte de médicos e educadores de que nem todas as manifestações de dificuldades de leitura têm uma causa fonológica.  Para este grupo de pacientes a contribuição da oftalmologia é importante e torna-se um diferencial de significativo impacto em beneficio da aprendizagem.

Estima-se que 70 a 80%  da aprendizagem até os 12 anos  dependa do sentido visual  – o reconhecimento de seu impacto em déficits de leitura e aprendizagem e o fortalecimento na   capacidade de interação da oftalmologia com os demais profissionais da área de saúde e educação propiciará  novas modalidades de intervenções trans e multidisciplinares construindo um melhor  futuro educacional  e profissional para os portadores destes déficits.

O trabalho da Fundação Hospital de Olhos (Fundação  Holhos).

Atualmente, graças ao trabalho da Fundação Hospital de Olhos em Belo Horizonte, já existem 2000 profissionais distribuídos em 25 Estados brasileiros aptos a rastrear a Síndrome de Irlen. São profissionais da saúde e educação capacitados em cursos teórico-práticos de 30 horas em média sobre “Disturbios de Aprendizagem Relacionados à Visão”.  Os cursos os preparam para identificar as distorções visuoperceptuais nos portadores da Síndrome e intervir selecionando corretamente os overlays para uso individual.  Os overlays são um recurso assistivo de baixo custo, não invasivo e com alto potencial benefico nos casos bem indicados.  Este recurso deve ser usado em leituras durante as aulas, tarefas escolares e atendimentos de reforço escolar e intervenções psicopedagógicas, fonológicas, etc, por melhorarem as condições de conforto visual e contraste na leitura.

Através do “Projeto Bom Começo” e em parceria com a UFMG; a Fundação HOlhos acompanha a saúde visual e auditiva  desde a pré-escola, buscando detectar, intervir precocemente e prevenir as perdas progressivas e assim assegurar o futuro escolar  em caso de déficits.  No escopo deste projeto, promove-se ainda work-shops de 8 horas para os professores da rede publica do ensino fundamental ( 6900 professores  já  receberam  esta  formação em 8 estados ) conscientizando-os sobre o desenvolvimento e desempenho visual na infância, as habilidades a serem desenvolvidas e os impactos dos déficits na aprendizagem em geral ( áreas visuomotoras, processamento espacial, temporal, tridimensional, etc).  Os cursos discutem também as formas de intervenção por integração multidisciplinar incluindo temas da terapia ocupacional, fisioterapia, psicopedagogia etc. Os projetos em cada município abrangendo a   zona urbana e muitas vezes também a rural, são  realizados pelos  profissionais locais devidamente capacitados e sob nossa supervisão.  As ações posteriores de recuperação pedagógica dos alunos em defasagem na lecto-escrita e a distribuição dos overlays  é delegada  aos profissionais locais  estimulando  a  apropriação personalizada da ferramenta segundo o perfil da comunidade.

 

O “Projeto Bom Começo” já foi adquirido e está em aplicação em Vancouver, Canadá “The Right Start Project” desde 2012.  Há também uma modalidade mais completa para o monitoramento continuado e cadastro  geral da saude visual, auditiva,  cardiovascular,  peso, altura, imunização etc  de toda a população escolar  adquirido  pelas prefeituras  cujos programas foram desenvolvidos  com apoio da  Microsoft/ Fundação Bill e Melina Gates.

O Laboratório de Pesquisa Aplicada à Neurovisão – LAPAN é um centro de pesquisa  especializada no estudo do processamento visual e no desenvolvimento de tecnologia e inovação, contando com uma equipe multidisciplinar composta por cientistas de diversas áreas e formações.  Tem caráter translacional, visando fazer com que as descobertas saiam dos laboratórios de pesquisa e cheguem à pratica clinica.