Rua da Paisagem, 220 – Vila da Serra BH / MG
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Durante o mês de Novembro de 2014, cerca de sessenta crianças, com idade de 9 anos, matriculadas no terceiro ano do Ensino Fundamental da rede municipal de ensino da cidade de Nova Lima, foram triadas a cerca da Síndrome de Irlen por profissionais da Fundação HOlhos.
A triagem é uma das etapas do Projeto Bom Começo, desenvolvido pela Fundação HOlhos, com intuito de auxiliar escolares, familiares e profissionais das áreas de educação e saúde na melhora da aprendizagem, através da capacitação de profissionais e pelo fornecimento óculos para correção refracional e overlays, de acordo com a necessidade de cada criança.
Ainda no mês de Novembro foi ministrada palestra na Escola Municipal Benvinda Pinto Rocha para pais das crianças com indicativo de uso de overlay e para os professores dos mesmos.
Durante os dias 01 a 04 de Outubro de 2014 a Fundação HOlhos realizou a XXIII edição do Curso de Distúrbios de Aprendizagem Relacionados à Visão. Foram mais de 90 profissionais de todo o Brasil a se capacitarem a respeito da metodologia de triagem diagnóstica da Síndrome de Irlen. Dentre esses profissionais, haviam Psicopedagogos, Psicólogos, Professores, Pedagogos, Oftalmologistas, Neuropsicólogos, Fonoaudiólogos, Diretores escolares, Ortoptistas e Psicomotricistas. A procedência também foi bastante variada, desde Belo Horizonte e cidades vizinhas, até mesmo Bahia, Acre, Rio de janeiro, Paraná, Pará, Distrito Federal, Maranhão, Rio Grande do Sul e Espírito Santo.
Durante o XXIII Curso DARV ocorreu a primeira turma de recertificação de Screeners. Os profissionais participantes renovaram suas técnicas de aplicação da Metodologia, agregaram novos conhecimentos e receberam homenagem.
A Síndrome de Irlen (S.I.) é uma alteração visuoperceptual, causada por um desequilíbrio da capacidade de adaptação à luz que produz alterações no córtex visual e déficits na leitura. A Síndrome tem caráter familiar, com um ou ambos os pais também portadores em graus e intensidades variáveis. Suas manifestações são mais evidentes nos períodos de maior demanda de atenção visual, como nas atividades acadêmicas e profissionais que envolvem leitura por tempo prolongado, seja com material impresso ou computador¹.
A caracterização desta síndrome foi feita pela psicóloga Helen Irlen, com um estudo prospectivo envolvendo centenas de adultos considerados analfabetos funcionais pela leitura deficiente e baixa escolaridade. O estudo, aprovado e financiado pelo Governo Federal Americano, foi apresentado perante a Associação Americana de Psicologia em Agosto de 1983.
A pesquisadora concentrou seus estudos nos sintomas “visuais” que estes adultos apresentavam, denominando-os de Síndrome da Sensibilidade Escotópica – fazendo alusão ao escuro – devido à preferência por locais menos iluminados durante tarefas com maior exigência visual. Além da fotofobia, cinco outras manifestações podiam estar presentes: problemas na resolução viso-espacial, restrição de alcance focal, dificuldades na manutenção do foco e astenopia e na percepção de profundidade².
A fotofobia geralmente se manifesta através de queixas de brilho ou reflexo do papel branco, que compete com o texto impresso e desvia a atenção do conteúdo a ser lido, comprometendo a atenção. Luzes fluorescentes são particularmente desconfortáveis e geram irritabilidade. Até mesmo a luz solar direta, faróis de carros e postes à noite causam incomodo aos portadores da SI e cefaléias por essa exposição³. Em muitos casos, há hábito de uso constante de óculos de sol.
As alterações da habilidade de resolução viso-espacial produzem sensação de desfocamento e de movimentação das letras que pulsam, tremem, vibram , aglomeram-se ou desaparecem, impactando na atenção e compreensão do texto que esta sendo lido. As distorções à leitura foram também objeto de relatos por parte de outros autores como Meares (1980), Whiting (1985) e Robinson & Miles (1987)4,5,6.
A restrição do foco limita a abrangência visual e reduz o número de letras apreendidas fazendo com que palavras sejam vistas parceladamente, o que requer uma segunda etapa associativa para coerência e compreensão. A restrição no alcance focal pode ainda causar dificuldades na organização do texto em segmentos significativos ou porções sintáticas, sendo esta uma característica presente em leitores deficientes. Em geral, bons leitores ampliam progressivamente o campo de visão, passando a reconhecer as palavras familiares pelo conjunto ou lexicalmente de forma a registrar as pistas visuais necessárias para uma interpretação rápida e correta do significado do texto naquele ponto.
As dificuldades na manutenção da atenção do foco, pelo fato do texto impresso apresentar-se menos nítido ou desfocado após um intervalo variável em leitura, produz estresse visual ou astenopia.
A astenopia, sempre presente em intensidade variável, se caracteriza pelo desconforto visual associado à sensação de ardência e ressecamento ocular, aumento da necessidade de piscar, olhos vermelhos e lacrimejantes, necessidade de coçar e apertar os olhos, com mudanças na posição e distância da cabeça até o papel impresso, sonolência e busca de pausas para “descanso visual”.
As dificuldades com percepção de profundidade, habilidade que possibilita a correta avaliação tridimensional, tem impacto direto em atividades como dirigir, estacionar, prática de esportes com bola, de movimento em geral, descer e subir escadas, atravessar portas, passarelas, usar escadas rolantes entre muitas outras situações cotidianas, nas quais a antecipação visual constitui fator de segurança e rapidez de ajuste ao ambiente.
Os sintomas físicos da S.I. são essencialmente oculares, ocorrendo lacrimejamento, prurido e ardência ocular, tendência à esfregar os olhos e/ou tampar/fazer sombra enquanto lê, apertar e/ou piscar os olhos excessivamente, balançar ou tombar a cabeça, sensação de cansaço após 10 a 15 minutos de leitura – que é feita preferencialmente na penumbra – além de história familiar de dificuldades com leitura e fotofobia.
A prevalência é alta, pois atinge de 12-14% da população em geral, incluindo bons leitores e universitários e torna-se proporcionalmente mais frequente quando há concomitância com déficits de atenção e Dislexia (33 a 46% dos casos). Estudo recente, realizado em escola municipal da rede publica em Belo Horizonte, detectou ainda uma incidência de 17% entre alunos com dificuldade de leitura7.
Atualmente estão sendo revistas as relações entre as lesões pós-traumáticas, envolvendo o cérebro, e os comprometimentos secundários da eficiência visual com exacerbação da fotossensibilidade e déficits na oculomotricidade, gerando impactos na leitura, aprendizagem, memória e estabilidade emocional. Sabe-se que também podem ocorrer na Dislexia, Déficits de Atenção e Hiperatividade, no Autismo e durante o uso de certos medicamentos. Como os sintomas são semelhantes, o diagnóstico diferencial é indispensável para que a conduta ideal seja adotada o mais precocemente possível, uma vez que a intervenção gera benefícios nas outras áreas do processamento, como as auditivas, motoras e cognitivas8.
São sintomas comuns: a confusão entre os números, percepção de distorções visuais em páginas de texto, leitura de palavras de baixo para cima e inversão de letras e palavras, espaçamento irregular, dificuldades em manter-se na linha ao escrever, lentidão e baixa compreensão. Entretanto inexistem outros aspectos que facilitarão na condução de um diagnostico diferencial satisfatório. Na Síndrome de Irlen, ao contrario da Dislexia, estarão ausentes as alterações na percepção auditiva, escrita invertida, pronuncia incorreta, dificuldade na aquisição da fala e escrita, escrita espelhada e déficits na compreensão de ordens verbais, cuja intervenção será supervisionada por fonoaudiólogos. Do mesmo modo, a prolixidade, impulsividade, falta de autocontrole pessoal ou em grupo, agitação e hiperatividade física são componentes dos quadros de déficits de atenção e hiperatividade e a intervenção medicamentosa, quando recomendada, será feita pelo neurologista responsável pela coordenação destes atendimentos multidisciplinares.
Sejam em comorbidade, ou isoladamente, estes distúrbios provocam uma série de manifestações semelhantes e por isto, diversos autores preconizam o rastreamento da Síndrome de Irlen em crianças com dificuldades na leitura, fotossensibilidade e manutenção da atenção aos esforços visuais prolongados, como uma forma de evitar diagnósticos equivocados de Dislexia, DTA e TDAH e ainda para minimizar a medicação em pacientes onde a agitação e desatenção são resultantes do estresse visual e dificuldade em se ajustar às condições de luminância de uma sala de aula, por exemplo.
Imagens captadas por Ressonância Magnética Funcional de um paciente portador de Síndrome de Irlen onde se observa a hiperexcitabilidade cortical durante a leitura sob estresse visual e após a interposição de filtros seletivos individuais. (Copyright Steve Stanley, Australia)
A identificação da Síndrome é feita por profissionais da saúde e educação devidamente capacitados a identificar (teste de screening ou rastreamento) os portadores da síndrome, através da aplicação de um protocolo padronizado conhecido como Método Irlen, e classificar o grau de intensidade das dificuldades visuoperceptuais dos casos suspeitos9. O teste de screening é feito após avaliação da acuidade visual e sob correção refracional atualizada, quando necessária. Pelo screening verificamos os benefícios, com a supressão das distorções visuais, pela interposição de uma ou mais transparências coloridas selecionadas individualmente pelo portador da Síndrome de Irlen.
Aplicação do Método Irlen onde ocorre a indução de estresse em atividades com alta demanda “visuoatencional” e posterior supressão após a sobreposição de uma lâmina colorida individualmente selecionada.
Uma vez determinada a transparência ideal o portador passa a usá-la sobre o texto durante a leitura ou cobrindo a tela do computador enquanto lê, obtendo benefícios imediatos no conforto visual, fluência e compreensão.
A neutralização das distorções facilitará o reconhecimento das palavras lidas, mas obviamente não permitirá que a pessoa leia palavras que não sabe. Para estes indivíduos, a leitura sempre foi sinônimo de dificuldade e a rejeição tornou-se um habito incorporado – é preciso considerar que pode haver anos de atraso em relação aos leitores regulares que puderam adquirir um substancial vocabulário visual de reconhecimento instantâneo. Obviamente, o aprendizado das palavras será facilitado por não mais se apresentarem distorcidas – mas a assistência ao aprendizado será importante e sem ela a leitura permanecerá sendo uma atividade difícil e estressante.
Do mesmo modo, o uso de filtros não será o único fator necessário para o aperfeiçoamento no desempenho da leitura, porém nos casos de Síndrome de Irlen a opção pelo tratamento significará um recurso não invasivo, de baixo custo e alta resolutividade, possibilitando a seus usuários uma potencialização dos benefícios aferidos aos seus esforços acadêmicos e profissionais, além de facilitar o trabalho da equipe multidisciplinar que os assistem.
É interessante observar que a boa parte dos portadores não tem consciência de suas distorções à leitura, como estas aparecem após um tempo médio de 10 a 15 minutos de leitura, eles pressupõem que isto ocorra a todos – sem se dar conta de que a dificuldade é só deles – e mais ainda se estiverem sob excesso de luzes fluorescentes, contraste, cores fortes, muito volume de texto por pagina, letras menores e impressão em papel brilhante. O mais preocupante é que esta é exatamente a situação em que se aplica a prova do ENEM – centenas de estudantes com Síndrome de Irlen não identificada terão seu desempenho prejudicado pelo estresse visual e hipersensibilidade à luz, cansaço progressivo e dificuldade em manter a atenção por tempo prolongado, com erros na transferência de gabaritos e falta de compreensão por déficits na eficiência visual.
Classicamente, os profissionais envolvidos com a triagem, diagnóstico e tratamento dos Distúrbios de Aprendizagem são os psicólogos, pedagogos, neurologistas, fonoaudiólogos, psiquiatras e pedagogos, cabendo ao oftalmologista a identificacao e tratamento dos distúrbios visuais, um papel incorretamente considerado secundário neste trabalho multidisciplinar. Tradicionalmente o oftalmologista concentra sua atenção na aferição da acuidade visual, correção refracional quando necessária, e identificação de patologias (catarata, glaucoma, estrabismo, etc). Porém a visão é o sentido mais importante na aprendizagem, com uma dependência estimada em 80% até os 12 anos de idade, e os impactos dos déficits neurovisuais são sempre significativos, e no entanto a sua identificação pelo exame oftalmológico padrão seria insuficiente, pois o oftalmologista atual privilegia a acuidade da visão e fatores ligados ao trabalho ocular, além de condições ópticas. Mal comparando, seria como avaliar o computador (hardware), quando o paciente possui déficits no processamento visual cerebral (software).
É relevante assinalar que o “conceito de visão” que o oftalmologista possui determinará a forma como aborda as queixas e sintomas visuais dos pacientes com distúrbios de aprendizagem. As conclusões geradas de seus exames e a forma como investiga as relações entre elas dependerão não apenas do tipo de exame realizado, mas também de seu conhecimento clínico na área específica, das queixas fundamentais, do direcionamento de sua anamnese e ainda de sua capacidade de interação com os demais profissionais da área de saúde e educação, com os quais passará a se relacionar não mais de forma passiva, mas como interventor e facilitador das decisões trans e multidisciplinares que afetarão o futuro escolar desta população10.
Referências:
1- Irlen H. The Irlen Revolution. New York, Square One Publishers, 2010
Segundo Ohlweiler (2006), a base da aprendizagem se concentra nas modificações que o sistema nervoso central (SNC) sofre durante a recepção de novas informações. Como descreve Riesgo (2006) quando chega no SNC uma informação conhecida, ela gera uma lembrança, que nada mais é do que uma memória; quando chega no SNC uma informação inteiramente nova, ela nada evoca e, sim produz uma mudança, isso é aprendizado, do ponto de vista estritamente neurobiológico.
As dificuldades de aprendizagem são consideradas obstáculos à aquisição de novos comportamentos e podem ser devidas a fatores neurobiológicos, sociais. As dificuldades de aprendizagem causadas por alterações genéticas no SNC são caracterizados como transtornos de aprendizagem.
Os transtornos de aprendizagem vem sendo cada vez mais estudados, visto que podem ser obstáculos ao sucesso profissional que está diretamente ligado às habilidades acadêmicas. Existem discrepâncias entre autores sobre a conceitualização e classificação dos chamados transtornos de aprendizagem.
Assim Ohlweiler (2006) define que os transtornos de aprendizagem compreendem uma inabilidade específica, como de leitura, escrita ou matemática, em indivíduos que apresentam resultados significativamente abaixo do esperado para seu nível de desenvolvimento, escolaridade e capacidade intelectual.
Selikowitz (2001), descreve as dificuldades de aprendizagem como uma condição inesperada, que ocorre em uma criança de inteligência média ou superior, caracterizada por um atraso significativo em uma ou mais áreas de aprendizagem.
A dislexia, que é um transtorno de leitura, é o transtorno mais freqüente e cuja reabilitação é mais trabalhosa e também passa por dificuldades semelhantes de conceitualização e classificação.
Já o DSM-IV-TR (2000), conceitua o transtorno da leitura como:
rendimento em leitura substancialmente inferior ao esperado para a idade cronológica, inteligência e escolaridade do indivíduo.
A sensibilidade do sistema visual a certos comprimentos de onda provoca distorções no processamento pós-retiniano, fazendo com que os impulsos elétricos cheguem ao córtex cerebral em momentos distintos, com perda da qualidade da interpretação visual caracterizando uma desorganização no processamento cerebral das informações recebidas pelo sistema visual (Irlen, 1987). A SSE afeta 12 – 14% da população geral (Irlen, 1987), pessoas de todas as idades, com inteligência normal ou superior à média. O diagnóstico é realizado utilizando-se questionários e provas que mensuram e qualificam o processamento visual central. Ao final dos testes é feita a prescrição dos filtros seletivos para os óculos e/ou de transparência para a filtragem espectral seletiva.
As transparências são utilizadas para as atividades de leitura proporcionando melhora na velocidade, fluência, compreensão e tolerância à manutenção da atenção e foco por tempo prolongado.
Dessa forma nosso objetivo foi investigar as tonalidades das transparências mais selecionadas pelos pacientes.
Guimarães, R. Q. ;
Guimarães, M. R. ;
Faria, L. N.;
Pinotti, M.;
Guerra L. B.;
Soares, F. C.
Referncias Bibliogrficas:
American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002.
FRANÇA,M.; MOOJEN, S. Dislexia: visão fonoaudiológica e psicológica. IN:
Transtornos da aprendizagem, abordagem neuobiológica e multidisciplinar.
ROTTA,N.T; OHWEILER.L; RIESGO,R.S. Porto Alegre: Artemed, 2006.
SALLES, J. F.; PARENTE, M. A. M.P.; MACHADO, S. S. As dislexias de desenvolvimento: aspectos neuropsicológicos e cognitivos. Interações, jun. 2004, vol.9, no.17, p.109-132. ISSN 1413-2907.
IRLEN, H. Scotopic Sensitivity/Irlen Syndrome – Hypothesis and Explanation
of the Syndrome. Journal of Behavioral Optometry, v.5,p. 62-65, 1997.
IRLEN, H. Irlen Differential Perceptual Schedule. Long Beach, California:
Perceptual Development Corporation, 1987.
INTRODUÇÃO
Importantes autores(1-2-3-4) definem a dislexia do desenvolvimento como “sendo uma desordem na aprendizagem da leitura com competência, que acomete crianças com inteligência dentro dos padrões de normalidade, sem deficiências sensoriais, isentas de comprometimento emocional significativo e com oportunidades educacionais adequadas”. A base neurobiológica da dislexia está relacionada a alterações em circuitos neurais corticais em áreas secundárias e terciárias, parieto-temporais e occipitotemporais
esquerdas com envolvimento compensatório dos sistemas anteriores
em torno do giro frontal inferior e sistema posterior occipito-temporal direito(4).
É importante ressaltar que nem todas as dificuldades de leitura são dislexia. Existem outras alterações que podem explicar os problemas com a leitura como, por exemplo, a síndrome de Mears-Irlen (SMI). A SMI é um distúrbio visual-perceptivo cuja base neurológica acredita-se ser um déficit no córtex visual primário.(5-6)
A sensibilidade do sistema visual a certos comprimentos de onda espectrais provoca distorções no processamento pós-retiniano, fazendo com que os impulsos elétricos cheguem ao córtex cerebral em momentos distintos, com perda da qualidade da interpretação visual caracterizando uma desorganização no processamento cerebral das informações recebidas pelo sistema visual(6-7). A SMI afeta 12 – 14% da população geral(6), pessoas de todas as idades, com inteligência normal ou superior à média(8).
Assim, o portador de uma suposta dislexia, reavaliado segundo os critérios da SMI poderia ser reabilitado por meio da neutralização de seus sintomas e efeitos sobre o processamento visual central, diferentemente do que ocorre na dislexia.No presente trabalho avaliamos a prevalência da SMI em pacientes diagnosticados por profissionais da área como disléxicos.
METODOLOGIA
A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Santa Casa de Belo Horizonte sob o número 064/2008. A amostra foi constituída por 37 indivíduos, sendo 28 (75,7%) do sexo masculino e 9 (24,3%) do sexo feminino, alfabetizados, com diagnóstico de dislexia encaminhados ao Holhos, serviço de referência para a SMI. A média de idade foi de 11,8 anos. Para inclusão na pesquisa, o critério utilizado foi o diagnóstico e laudo de dislexia, independente do tipo apresentado. Critérios como sexo, idade e nível sócio-econômico não foram utilizados como instrumentos de inclusão ou exclusão.
Os dados dos pacientes e os resultados dos testes da triagem para a identificação da SMI nos pacientes foram extraídos do banco de dados do Hospital de Olhos de Minas Gerais, atendidos entre 2005 a 2007. Foram selecionadas as respostas aos questionários de Desconforto e Dificuldades com a Leitura, Distorções apresentadas pelo paciente, Overlay selecionada e os testes da Caixa A, Caixa B, Abóbora, Pingüim e Linhas Musicais e o filtro selecionado pelo paciente, todos propostos por Irlen (1987). Os resultados foram confrontados com os escores de normalidade Irlen (1987).
RESULTADOS
Os resultados mostram uma prevalência de SMI em 93% (34) dos pacientes, e 7% (3) pacientes não apresentaram confirmação do diagnóstico para SMI.
DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Os resultados apontaram um índice percentual muito elevado de indivíduos disléxicos com SMI, distintos daqueles observados na literatura que indicam 46% de co-morbidade(10).
Os resultados obtidos podem estar relacionados ao fato do HOlhos ser um serviço de referência e receber pacientes previamente triados gerando uma amostra “viciada”.Considerando-se que alguns dos sintomas da SMI e dislexia são muito parecidos pode haver confusão ao se determinar um diagnóstico de dislexia baseado exclusivamente nos padrões de habilidades e déficts à leitura em seus portadores. Embora o processamento fonológico seja considerado o fator chave no aprendizado da leitura, fatores adicionais como habilidades na percepção visual(11-12) e nomeação automática(13) são frequentemente subestimados pelos profissionais envolvidos
no diagnóstico e tratamento da dislexia.
CONCLUSÃO
Embora a dislexia e a SMI sejam entidades nosológicas distintas, a coexistência de sintomas reforça a necessidade de disléxicos serem avaliados pela metodologia Irlen, evitando diagnósticos falso-positivos nos casos de SMI e, ao mesmo tempo conscientizando os profissionais da área sobre a possível coexistência entre ambas entidades.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. ELLIS, A. W. Leitura, escrita e dislexia: uma abordagem cognitiva. 2 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
2- SALLES, J. F., PARENTE, M. A. M. P. & MACHADO, S. S. As dislexias de desenvolvimento: aspectos
neuropsicológicos e cognitivos. Interações: Estudos e Pesquisas em Psicologia,v.9, n 17, p.109-132, 2004
3- SALGADO, C.A. et. al. Avaliação fonouaudiológica e neuropsicológica na dislexia do desenvolvimento
do tipo mista: relato de caso. Salusvita, Bauru, v. 25, n. 1, p. 91-103, 2006.
4- TELES, P. Dislexia: Como identificar? Como intervir? Rev. Portuguesa de Clínica Geral, Lisboa, v.20, n 5, 2004.
5- HOLLIS, J. e ALLEN, P.M. Screening for Meares–Irlen sensitivity in adults: can assisment methods
predict changes in reading speed? Ophthal. Physiol. Opt. v. 26, p.566–571, 2006.
O relatório “Educação para todos”, da Unesco (2010), apresenta o Brasil na 88ª posição no ranking de desenvolvimento educacional, estando atrás dos países mais pobres da América Latina, como o Paraguai, o Equador e a Bolívia. Outro dado alarmante divulgado no referido relatório é a repetência média que na América Latina e no Caribe é de pouco mais de 4%, enquanto no Brasil é de quase 19%. E segundo dados do Ministério da Educação, cerca de 195.000 crianças e jovens abandonam as escolas brasileiras anualmente, por terem déficits de aprendizagem (MEC/2007).
As estatísticas mundiais sobre o impacto dos transtornos causados pelas dificuldades de aprendizagem no desajuste na vida social são bastante preocupantes e o prognóstico do seu desconhecimento por parte de educadores e autoridades é extremamente negativo. Dados fornecidos pela Associação Brasileira de Dislexia e Associação Brasileira do Déficit de Atenção mostram que:
• Apenas 10% das crianças com dificuldades de aprendizagem atingem escolaridade média; 46% dessas crianças são diagnosticadas com ansiedade, comprometendo grande parte da educação fundamental;
• O risco de abuso de álcool por quem fracassa na escola é 3 a 6 vezes maior do que para outros indivíduos;
• Pessoas com baixa escolaridade sofrem uma freqüência significativamente mais alta de intoxicações acidentais, queimaduras, quedas, desemprego e divórcio;
• Crianças que abandonam a escola têm até 40% mais probabilidade de usarem drogas ilícitas na adolescência.
Outro fator que interfere negativamente no sucesso da aprendizagem é a visão. Dados da Organização Mundial de Saúde, apresentados pela oftalmologista Dra. Elizabeth Brant em fevereiro de 2007 e referendados em 2009, pelo Projeto Olhar Brasil (Ministério da Saúde/Ministério da Educação), falam por si: 30% das crianças em idade escolar apresentam problemas de refração.
Estima-se que 30 a 60% dos alunos com baixo rendimento acadêmico não fracassam na escola por causa do seu “mau comportamento” ou simplesmente porque se empenham pouco nos estudos, como se pensa. Estas são pessoas cujas habilidades sociais e cujo desempenho escolar são afetados pela falta de estímulos na infância, pela alimentação inadequada ou em decorrência de síndromes hereditárias e disfunções cerebrais, que resultam, por exemplo, em transtorno do déficit de atenção e/ou dislexia.
A evasão escolar e o mau desempenho individual em atividades laborais, com suas consequentes limitações na qualidade de vida e dificuldade de inclusão no mercado de trabalho, acarretam prejuízos não somente na vida do indivíduo com déficits de aprendizagem, mas prejudicam também as famílias dos mesmos, bem como o desenvolvimento do país, já que haverá mais gastos com saúde pública, desemprego e marginalidade. Portanto, é de grande relevância encontrar um modo de intervenção eficaz para essas crianças, visando não apenas sua qualidade de vida, mas também a redução dos gastos em instituições de apoio ao menor infrator e até mesmo nos presídios, já que a sintomatologia permanece por toda a vida e pode agravar se não tratada, gerando comportamentos agressivos e inabilidade social.
Diante de estatísticas tão alarmantes, devemos nos preocupar em traçar estratégias para primeiramente identificarmos precocemente os indivíduos portadores de algum déficit, transtorno ou distúrbio de aprendizagem, seja em salas de aula ou consultórios, e assim intervirmos ou encaminharmos para os profissionais capacitados, conferindo-lhes maiores chances de um futuro promissor.
É justamente esta a proposta do Projeto Bom Começo – Programa da Acompanhamento da Criança na Escola que, através de metodologia e tecnologia, permite a realização dos exames de triagem, tanto na entrada da escola, quanto em acompanhamento anual. Em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais, a Fundação Hospital de Olhos (FHO) realiza, em um primeiro momento, a capacitação dos profissionais envolvidos (professores, gestores e profissionais da saúde). Posteriormente, são então realizados os exames de triagem visual, auditiva e de leitura, sendo os resultados enviados diretamente para o banco de dados centralizado. A partir da informação compilada, é possível emitir relatórios e traçar pesquisas e estatísticas, que servirão tanto para gestores públicos quanto privados, na orientação de suas políticas.
Dentro desta proposta, entre os dias 3 e 8 de maio, cerca de 980 professores e gestores educacionais do município de Montes Claros, MG foram capacitados por meio da metodologia do Projeto Bom Começo, através da parceria com a prefeitura local, a Associação de Promoção e Ação Social (APAS) e a Fundação Hospital de Olhos. Deste contingente, 800 professores e educadores passaram por um Seminário para identificação de crianças com distúrbios de aprendizagem ligados à visão, dentro das salas de aula. Concomitantemente, outros 180 profissionais, como pedagogos, psicólogos, oftalmologistas e professores, participaram do Curso de Dislexia de Leitura, somando-se a rede de screeners da FHO, que está presente em 18 estados brasileiros, com mais de 800 membros aptos a trabalharem com crianças e adultos que apresentam a Síndrome de Irlen, um dos distúrbios de aprendizagem ligados à visão.
Como bem diz o Prof. Marcos Pinotti (LAPAN e UFMG), o Brasil não pode se dar ao luxo de perder uma criança por descuidos na educação ou saúde. Precisamos de todas elas no futuro. Desta forma, o Projeto Bom Começo foi desenvolvido com as percepções do Prof. Pinotti, visando modificar a realidade de milhares de crianças e adolescentes, que hoje encontram-se a par do sistema educacional, mesmo, muitas vezes, dentro das salas de aula.
Marina Roberta Vieira Nogueira
Fisioterapeuta, Screener e Pesquisadora – Hospital de Olhos
Alguns poderiam ter ilusões quanto à fraca qualidade da nossa educação. Contudo, lá pela década de 60, começaram a aparecer os primeiros testes, mostrando o quão ruim ela era. A curiosidade inevitável passou a ser: Por que seriam tão lastimáveis as nossas escolas?
Os economistas se põem a campo para trabalhar estatisticamente os dados dos testes de rendimento escolar. Quem sabe desvendariam alguns segredos do nosso fracasso? Desde então, centenas de estudos se acumularam mostrando resultados bastante parecidos. A partir desses estudos (chamados de funções de produção, um nome do agrado dos economistas, mas que dá erisipela nos pedagogos), começamos a separar grandes categorias de variáveis explicativas.
Falamos daquelas medidas que captam as características pessoais do aluno (como inteligência e energia). Falamos também do seu meio socioeconômico, em que a educação, a riqueza e a ocupação dos pais tem peso expressivo, pois criam o caldo da cultura familiar, os valores e as formas de interação lingüística. De outro lado, está a escola e seus componentes: os professores, os administradores, os materiais, as formas de ensinar e de lidar com os alunos.
As pesquisas mostraram que os fatores mencionados acima, de fato, são os mais fortes determinantes do sucesso ou do fracasso escolar. Mostraram também os pesos relativos de cada um desses conjuntos. Embora os resultados não sejam exatamente iguais, de pesquisa à pesquisa, os fatores escolares têm sempre um peso menor. Tipicamente, daquela fração que estatisticamente explica as diferenças de rendimento escolar, entre um terço e um quarto cabe à escola. Ou seja, o resto, amplamente superior, cabe aos fatores pessoais e familiares.
Esse resultado se mostrou muito frustrante para pesquisadores e para aqueles interessados em melhorar a educação. A escola, em que podemos mexer e melhorar, tem um peso pequeno na determinação dos resultados. A família, e mais os elementos genéticos, têm um peso amplamente maior.
Não se pode mudar a genética. Nascemos com um potencial de inteligência, não mensurável, e ao chegar aos 5 ou 6 anos, já ocorreu o brutal impacto das diferenças de estimulação verbal e intelectual das famílias. E o que é pior, o alcance das intervenções que agentes externos podem fazer na família são muito limitados. Por exemplo, a educação dos pais é um dos fatores mais dramaticamente poderosos para determinar o sucesso escolar dos filhos. O mesmoacontece com sua renda. Mas nenhum dos dois podem ser modificados por políticas públicas.
A escola pode ser melhorada, mas seu tradicionalismo e inércia dificultam os aperfeiçoamentos. Há muitas linhas de ação, como melhorar o recrutamento e a formação dos professores, introduzir métodos didáticos de eficácia comprovada, escolher melhor os diretores e, por aí afora. A experiência mostra que tais táticas funcionam. Contudo, encontram sempre uma resistência espontânea da cultura escolar, além das lamentáveis barreiras ideológicas.
Certamente, a saúde dos alunos é um fator que afeta o rendimento escolar. Daí as preocupações em verificar acuidade visual e audição dos alunos. De fato, sabe-se que há uma fração de alunos de baixo rendimento que, na verdade, não têm problemas de Dislexia ou de ordem psicológica, mas deficiências de audição e visão.
Tradicionalmente, espera-se que algo como 3% da população escolar apresente problemas nessa linha, com um nível de gravidade que comprometa o aprendizado. Portanto, com exames simples e pouco dispendiosos, podemos identificar esses alunos e lidar com as terapias apropriadas para suas deficiências. Ou seja, de tudo que se pode fazer para consertar o nosso ensino, esses problemas de saúde são os que encontram uma resposta mais definitiva e uma intervenção menos dispendiosa. Mas afetam relativamente poucos.
Poucas intervenções são possíveis nas variáveis familiares. Muitas intervenções na escola são viáveis, mas são delicadas, caras e de lento impacto. As intervenções de saúde são fáceis e baratas, mas afetam uma proporção muito pequena da população-alvo.
Contudo, esse quadro começa a apresentar uma nova abertura. Descobrem-se problemas de visão, não detectados pelos testes convencionais de acuidade visual.
Esses testes antigos verificam se o paciente consegue ler letras colocadas a diferentes distâncias. Com ele, é possível identificar aqueles que precisam de lentes corretivas. Estamos aí, talvez, em faixas bem abaixo de 5%.
Acontece que a leitura não é de letras, uma a uma, mas do encadeamento delas em palavras e frases. Para que sejam lidas, dada a estreiteza do campo visual que consegue discriminar o tamanho das letras, o olho precisa se mover, acompanhando a seqüência de palavras. Mas são dois olhos que precisam se mover de forma sincronizada para fixar e registrar a imagem. Por conta de circuitos do sistema visual, que estão fora do globo ocular, há alguns para quem os dois olhos não conseguem se mover em perfeita sincronia. Isso dificulta a leitura, comprometendo a compreensão, tornando-a mais lenta, cansativa, difícil, por vezes, até mesmo, impossível depois das primeiras linhas.
Se for relativamente fácil identificar essa deficiência do sistema visual e se for possível uma intervenção para lidar com ela, estamos diante de uma nova abertura para melhorar o rendimento escolar. Felizmente, ambas as premissas tem uma resposta positiva.
Há aparelhos relativamente simples. Consistem em uma viseira com um instrumento que acompanha a movimentação ocular e mais um software apropriado para processar os dados captados . Em segundo lugar, descobriu-se que filtros bloqueando a transmissão de certas freqüências luminosas permitem corrigir a trajetória dos olhos obtendo melhor fixação e sincronização delas. Sendo assim, há terapias eficazes e que são pouco dispendiosas.
Portanto, esses achados científicos abrem uma nova fronteira, ao identificar e curar alunos cujas dificuldades de leitura estavam erroneamente identificadas. Se a incidência desses problemas fosse residual, seria um avanço importante para os poucos que sofrem desses desencontros nas trajetórias dos olhos. O que torna essa descoberta espantosa é a elevada incidência dessa síndrome. Esse talvez seja o dado mais precariamente medido nos dias de hoje. Ainda assim, estimativas muito preliminares sugerem que até 20% da população tem algum problema desse tipo.
A se confirmarem esses números, estamos diante de um déficit educacional que pode ser resolvido com medidas pouco dispendiosas e de impacto imediato. É difícil imaginar uma intervenção que tenha um impacto mais direto sobre o rendimento escolar de uma proporção muito significativa de alunos.
Quem está levantando essa lebre no Brasil e avançando muito rapidamente nas suas pesquisas é a equipe do Dr. Ricardo Guimarães. Graças a eles, parece que estamos no umbral de um salto muito significativo no que podemos fazer para melhorar a nossa educação. Em parceria com a UFMG, com financiamento do CNPq, estão sendo desenvolvidos aparelhos menos dispendiosos e mais eficientes para acompanhar a trajetória dos olhos. No lado da pesquisa, alguns municípios estão se voluntariando para uma aplicação universal nas escolas, permitindo a criação das bases de dados que responderão às nossas indagações. Há um futuro promissor e os órgão de financiamento público de pesquisa estão dispostos a apoiar programas nessa linha. Mas nesse momento, paremos um minuto para agradecer ao Dr. Ricardo Guimarães por ter se metido nesse assunto.
Prof. Cláudio M. Castro
Ph.D em Economia, escritor e pesquisador da área de educação