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Síndrome de Irlen & Distúrbios de Processamento Visual pela Via Magnocelular – Por que ler pode ser tão difícil?

Profa. Dra. Marcia Reis Guimarães

Fundação Hospital de Olhos – Belo Horizonte, MG

 

Contextualização:

A oftalmologia dedica a maior parte de sua atenção ao estudo e correção dos erros refracionais, alterações da binocularidade e alinhamento entre os olhos e ao estudo de doenças oculares. Embora saibamos que os olhos têm a mesma origem embriológica e representem uma exteriorização do cérebro, pouca atenção ainda é dada a esta relação – devemos estar atentos ao fato de que a Visão é uma habilidade CEREBRAL e que o olho é um captador de estímulos luminosos, transformando-os em estímulos neurológicos  que serão  processados  em diversas sub-áreas  especializadas  a partir de uma área primária  ou V1  – visão envolve contraste, cor, movimento, direcionamento, texturas, tridimensionalidade, contextualização, memorização etc. E é por isto que  se  considera a visão como o sentido mais impactante do aprendizado escolar até os 12 anos de idade.

 

Uma boa visão depende de dois pontos fundamentais. A primeira é a condição anatômica, fisiológica e correlação óptica das estruturas dos nossos olhos, tais como a córnea e o cristalino, lentes que determinam o foco de luz exatamente sobre a retina ou da íris onde é feito o controle dinâmico da luminosidade. A segunda é a condição neurosensorial sobre onde e como os estímulos fotoquímicos são processados pelos sistemas integrados cerebrais gerando habilidades que se aprimoram progressivamente e com vigor especial nas diversas “janelas de oportunidade” onde o desenvolvimento de redes neuronais é mais favorecido.

 

Histórico:

No inicio da década de 80, o governo do estado da Califórnia, preocupado com a inserção no mercado de trabalho de mais de 12 000 adultos considerados analfabetos funcionais como forma de prevenção de criminalidade promoveu um estudo em larga escala desta população.   Á frente e coordenando este projeto, a profa. Dra. Helen Irlen, psicóloga educacional da Universidade da Califórnia em Long Beach, observou  que uma parcela   desta população apresentava  sintomas visuais acentuados que os impediam de adquirir e/ou manter uma leitura satisfatória  – este grupo recebeu atenção especial  por não se enquadrar no quadro clássico de dislexia e outras formas de transtornos conhecidas à época.  Após 3 anos de pesquisa sob financiamento federal  e como parte de seu trabalho à frente do Departamento de Psicologia, seu trabalho, resultados e  critérios visando o rastreamento e  identificação dos distúrbios visuais foi apresentado à  American Psychological Association  em 1983.

Inicialmente chamada de Síndrome da Sensibilidade Escotópica devido à fotofobia acentuada e manifesta preferência de seus portadores por ambientes com pouca luminosidade, a denominação considerava a hipótese de que as distorções estariam associadas a alterações nos bastonetes retinianos.

Embora haja evidências de que portadores de dificuldades à leitura tenham uma distribuição diferente de cones e bastonetes na retina e que estes usem mais informações derivadas da região parafoveal do que os leitores normais (Geiger et Lettvin, 1987, Grosser & Spafford,1989; Spafford & Grosser 1991; Solman, Dain et Keech, 1991) as teorias mais recentes indicam que as alterações ocorreriam na transmissão dos sinais dos sistemas Magno e Parvocelulares ao cérebro (Livingstone, Rosen, Durlane, Galaburda, 1991).

Atualmente o conjunto de sintomas apresentados por portadores desta disfunção perceptual é caracterizado como Síndrome de Irlen (SI). A existência da SI- como entidade clinica individualizada foi evidenciada por Muller (1985) e Adler & Atwood(1987).

 

Síndrome de Irlen    

Todos nós consideramos a leitura como uma habilidade natural e automática porque a realizamos sem esforço algum. Entretanto para muitas crianças e adultos  o ato de ler é um verdadeiro pesadelo e esta é a realidade para 10 a 15%  da população.  A leitura é a habilidade mais difícil e complexa que a espécie humana desenvolveu – e embora nos sejam dados muitos anos para aprender a falar  concedemos apenas um ano ou pouco mais para que nossas crianças aprendam a ler.  Ler não é intuitivo como falar e embora haja uma área  cortical para a linguagem, isto não ocorre na leitura.

Quando se lê, há estimulação da parte posterior do cérebro incluindo o lobo occipital que se ativa pelo formato das letras, o giro angular transcreve os grafemas em fonemas e a região de Wernicke acessa o significado. Nesta síntese, já se pode perceber como são complexos os processamentos neurológicos da leitura e linguagem e infelizmente não concedemos aos nossos alunos um tempo adequado para este aprendizado.

A verdade é que a pressão atual é muito maior: crianças na educação infantil (antiga pré-escola) já são cobradas quanto à capacidade de reconhecer uma letra, associar ao respectivo som e reconhece-las em palavras – não há duvidas de que estamos pedindo demais e muito cedo e muitas delas não estarão maturas para a complexidade exigida para a leitura.  As dificuldades podem afetar a auto imagem das crianças e seu interesse pelo aprendizado em geral tornando a mágica do acesso à escola um terrível pesadelo.  Por isto, é necessário identificar esta população e resgata-las precocemente antes que a leitura se transforme em dificuldade intransponível.

Excluindo-se os déficits mentais, cegueira, etc, são duas as principais causas especificas de aquisição da Leitura: a Dislexia  de desenvolvimento e a Síndrome de Irlen.  A Dislexia vem sendo amplamente discutida e já se tem amplo conhecimento da importância do apoio multidisciplinar que não raro será necessário ao longo de toda a vida de seu portador nas formas mais severas de manifestação.

É oportuno que professores e gestores tenham acesso às informações sobre a Síndrome de Irlen.

O reconhecimento da S.Irlen no Brasil se iniciou pelo trabalho realizado na Fundação Hospital de Olhos junto a crianças em idade escolar voltado para a prevenção e saúde visual.  O que intrigou os oftalmologistas era o fato de que uma parcela delas, NÃO CONSEGUIA APRENDER A LER, embora se apresentassem dentro da normalidade pelo exame de rotina bem detalhado (refracional, ortopico, etc). Eram espertas, inteligentes, participativas, expressavam-se bem durante os exames, mas não se saiam bem na leitura e havia queixas de fotofobia, prurido ocular, ardência, lacrimejamento e cansaço visual crescente, sonolência , perda da concentração, baixo rendimento escolar e a sensação de que o texto “ia ficando mais ofuscado, cansativo, com letras pareciam tremer  ou se agrupar fazendo com que perdessem a atenção e o local onde tentavam ler”.

Curiosamente estas dificuldades também apareciam ao copiar, no computador, ao olhar o quadro negro, na pratica de  esportes e até quando andavam de ônibus ou de carro levando-os a ter enjôos  e ainda relatavam  a ocorrencia de  pequenos acidentes,  esbarrações em  cadeiras, portas, deixando cair cadernos, pastas, copos, etc.

Este conjunto de sintomas que se manifesta de maneira completa ou parcial foi descrito ainda em 1983, pela psicóloga educacional e familiar Helen Irlen. Hoje é internacionalmente conhecido como Síndrome de Irlen.

A Síndrome de Irlen é uma alteração visuoperceptual, causada por um desequilíbrio da capacidade de adaptação à luz que produz alterações no córtex visual e déficits na leitura, tendo caráter hereditário e manifestando-se sob maior demanda de atenção visual, como leitura de texto ou trabalho no computador.¹ Por isto, o  exame oftalmológico dos suspeitos deve ir além dos problemas nos olhos e da acuidade visual ( Tabelas com letras de tamanhos decrescentes) feitos em condições estáticas – o exame investiga a oculomotricidade e a eficiência do processamento visual já em nível cerebral.

Para ler, movimentamos os olhos rápida e sincronizadamente envolvendo vários processos cognitivos multimodais – mal comparando, o olho seria o hardware e os déficits no processamento visual uma alteração no software.           

O quadro é composto 6 manifestações: fotofobia, problemas na resolução viso-espacial, dificuldades na manutenção do foco, estresse visual, alteração na percepção de profundidade e cefaleias aos esforços visuais prolongados².

Segundo os portadores, o brilho ou reflexo do papel branco contra o texto seja sob luz natural ou fluorescente³ causa irritabilidade, sensação de movimentação das letras que “pulsam, tremem, vibram, confluem ou desaparecem”4 e a leitura passa a ser fragmentada. Além disso, sentem-se inseguros ao dirigir, estacionar, tendo dificuldades com esportes com bola e ao usar  escadas rolantes.

A prevalência da S.I. é maior que a da própria Dislexia (estimada entre 3 a 6% da população). Entre bons leitores, está presente em 14% deles, entre maus leitores e portadores de deficits de aprendizagem, as porcentagens crescem para 17 a 46%.  É freqüente a co-associação com Déficits de Atenção e Hiperatividade. Nestes, o diagnóstico diferencial pré-intervenção é indispensável6.

Na S.I., ao contrário da Dislexia, não há alterações auditivas, da fala e linguagem.   A prolixidade, impulsividade, falta de autocontrole, agitação e hiperatividade dos TDAs e TDAHs merecerão intervenções medicas e/ou muldisciplinares.        

As intervenções identificam e neutralizam as faixas de luz mais hipersensibilizantes. Através de transparências de cores especificas, eliminam-se as distorções visuoperceptuais levando de imediato a uma leitura mais fluente e compreensível, caso o portador esteja alfabetizado.

As transparências são um Recurso Assistivo não invasivo, de baixo custo e alta resolutividade, que potencializam o efeito das intervenções multidisciplinares mesmo na própria dislexia, se houver déficits visuais envolvidos. (O custo aproximado de uma transparência é de 20 reais por aluno).

Os portadores da S.I.  não têm consciência de suas distorções pois estão habituados a  percebe-las sempre que lêem.  Por isto, pressupõem que isto ocorre em toda a população  –   e este fato explica  a frustração e baixa auto-estima geradas pela lentidão e esforço na leitura que  sentem enquanto que, para seus pares,  esta mesma atividade  é considerada  prazeirosa e natural. Estudos na população carcerária mostraram uma  incidência de 82% de portadores de S.I. 9,  demonstrando claramente a relação entre a exclusão social e a criminalidade.  Os lamentáveis e bem conhecidos efeitos psicossociais desta realidade são a agressividade, baixa escolaridade, desistência profissional e depressão. É ainda nesta situação preocupante que podem estar os milhares de candidatos ao ENEM sobrecarregados pela demanda de “sustentação da atenção à leitura prolongada”, cansaço visual progressivo e perda na compreensão.

O reconhecimento da S.I. pode ser feito por profissionais da saúde e da educação capacitados pelo Método Irlen,  aplicado em mais de 40 países. 8

A dependência da visão na aprendizagem é estimada em 80% e o screening, feito após exame oftalmológico; identifica a gravidade das distorções perceptuais quando presentes.

No Brasil, os oftalmologistas da Fundação Hospital de Olhos de Minas Gerais  cuja atuação esta voltada à promoção da saúde  visual e auditiva na escola  constavam que  crianças  e jovens atendidos  ao longo de seus 30 anos de atuação; ainda que  tivessem bom desenvolvimento neuropsicomotor e  acuidade visual normal  pelos exames oftalmológicos de rotina , sem  ambliopia,   estrabismo e outras patologias oculares;   podiam ainda assim  ter deficits de aprendizagem  por não conseguirem ler  satisfatoriamente.

Em 2005, iniciaram-se em Belo Horizonte, no Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães, os estudos brasileiros  na área, através de protocolos com grade de exames  mais amplos e respaldados em dados trazidos pela neurociência  – a   VISÃO  passou a ser avaliada também por suas habilidades cerebrais  e  termos como Processamento Visual, Neurovisão, Visão Cortical e Subcortical,  processamento espacial, temporal  e oculomotricidade passaram a  ser consideradas em portadores de  disturbios de aprendizagem  com exames voltados para a qualidade do Processamento Visual e não apenas do olho e da óptica ocular.

 

Atualmente, o diagnóstico da S.I requer avaliações multifuncionais, com ênfase na  dinâmica (oculomotricidade)  e o desempenho visual é posto à prova diante de condições de luminância variadas que desafiam a capacidade adaptativa de resposta e transmissão sensorial.

 

O que é Síndrome de Irlen?

A Síndrome de Irlen é uma disfunção visuoperceptual relacionada à exposição a certos tipos de iluminação, intensidade, comprimentos de onda e contraste e frequências espaciais que induzem dificuldades no processamento de informações requerendo maior exigência atencional e visual, como é o caso da leitura.  As dificuldades se devem principalmente a déficits no Processamento das informações visuais pela Via Magnocelular.

 

Os pacientes portadores da SI investem grande esforço em atividades de leitura devido a pouca eficiência e distorções que exigem adaptações visuais constantes pelo contraste do tipo figura-fundo, ou seja, ao contraste criado pelo texto impresso contra o papel branco o que lhe provoca a sensação de que o texto está sendo “engolido pelo branco à sua volta” reduzindo o tamanho das letras.

Este esforço visual gera fadiga, lentidão, desconforto, reduz a tolerância e tempo de exposição à atividade de leitura e compromete a manutenção de atenção, memorização e compreensão do texto.

Segundo Irlen, as dificuldades abrangem cinco áreas específicas e podem se manifestar em qualquer faixa etária sob intensidades variáveis de modo parcial ou conjunto.

A primeira manifestação se relaciona à fotofobia, geralmente relatada como percepção de brilho excessivo no papel que compete com o texto impresso desviando a atenção do leitor.  Esta fotossensibilidade extende-se a todos os aspectos da vida diária; quando há exposição direta à luz solar direta ou luzes fluorescentes, faróis de carros, spots de luz, ambientes como shoppings e supermercados, bancos, escolas e laboratórios entre muitos outros haverá desconforto.

Em geral, preferem ler à meia-luz, quase no escuro ou paradoxalmente reclamam que a luz está fraca à leitura.Outros comportamentos observados são as mudanças de posição para evitar o ofuscamento, tentativas de fazer sombra sobre o local, levando a mão à testa ou adotando um inseparável boné para diminuir a incidência de luz sobre o papel.  Na direção, sentem-se incomodados com brilhos no espelho retrovisor, luzes traseiras e de freio, reflexos dos carros à frente, enjoam e sentem-se incapazes de dirigir na chuva ou sob faróis altos que lhe provocam dores oculares intensas.

Em seguida, temos as dificuldades ligadas à resolução espacial, onde se observam o aparecimento de distorções perceptuais no texto, que produzem desfocamento, movimentação das letras que passam a tremer ou vibrar, se aglomeram ou se justapõem, invertem-se ou desaparecem, brilham, elevam-se do papel, produzem ondas ou mesmo redemoinhos na pagina com texto dentre muitas outras formas descritas pelos pacientes.  Em tais condições operacionais de leitura, entonação, pontuação e interpretação tornam-se inviáveis.

As distorções manifestam-se também durante a leitura de pautas musicais levando a dificuldades de interpretação de anotações, perda do local na partitura e preferência por tocar de ouvido, memorizando a partitura para não ter que lê-la ou progredindo pouco mesmo com praticas regulares.

A terceira área se refere a uma redução do alcance focal , com diminuição do numero de letras lidas a cada fixação.  Este fato leva à tendência para uma leitura fragmentada ou silábica das palavras, que são decodificadas parcialmente, dificultando o reconhecimento de pistas visuais necessárias à interpretação do significado do texto e a formação de um vocabulário visual adequado.

A manutenção da atenção visual ou foco gera dificuldades porque o texto tende a sumir ou se apresentar desfocado após um pequeno tempo de leitura.  Este fato gera a necessidade de seguir a linha com o dedo, perda de compreensão, necessidade de releituras, dificuldade de concentração e transposição de respostas para folhas de gabarito.

Cerca de 50 a 80% dos portadores da Síndrome de Irlen apresentam cefaléia em co-existência  às cinco manifestações supra descritas e não raro apresenta-se como queixa principal  em  pacientes com fotofobia e cansaço aos esforços visuais.

As cefaléias são uns dos principais motivos para consulta oftalmológica em pacientes jovens, ocorrendo em cerca de 8% dos casos.  Considera-se que hiperforias (eso ou exo) descompensadas poderiam ser um fator precipitador de enxaquecas; os quadros de  enxaqueca ou migrânea são também  freqüentes e podem acometer a faixa etária mais jovem,  razão pela qual a S. Irlen deve ser considerada entre os fatores etiológicos no extenso diagnóstico diferencial desta população nas clinicas oftalmológica, clinica  médica e neurológica.

Finalmente, o estresse visual se apresenta através de uma série de sinais (astenopia) que se revela pelo aumento do piscar, lacrimejamento, tendência a esfregar os olhos seguidamente e ainda de cobrir ou fechar um dos olhos, posições de cabeça aproximando-se ou se afastando do texto, olhos vermelhos, irritabilidade crescente.

Com freqüência os portadores manifestam sinais de agitação motora e demanda por interrupções e paradas para descanso durante leitura que se prolongue além de 10 ou 15 minutos, ou menos, dependendo das características do texto.  Há uma tendência em distrair-se em aulas e conferências, “sonhar acordado” buscando o alivio ao estresse visual crescente.

Outros componentes são as dificuldades com a percepção de profundidade, evidenciados em atividades da vida diária como descer uma escada, pegar um objeto na carteira, alcançar uma bola, acompanhar o movimento de uma bola durante uma partida esportiva e visualizar o jogador ao mesmo tempo, pular corda, etc. Adultos relatam dificuldades em estacionar, em manobras mudando de faixa ou fazendo conversões à direita ou esquerda e também em calcular a distância do carro à frente aproximando-se demais ou  mantendo distância excessiva por insegurança.

A prevalência da SMI em diversas populações foi investigada por vários autores.  Segundo Muller (1985), esta atinge 74% dos adultos com problemas de leitura e 15% daqueles considerados leitores habituais ou acima da média; neste ultimo grupo é comum a adoção de estratégias compensatórias visando minimizar o desconforto visual que os acompanha nestas tarefas. Neste grupo, com escolaridade de nível técnico ou superior, é freqüente a preferência por relatórios ditados, discussões em grupo, preferência por sinopses em lugar de textos completos, dificuldades em ouvir e anotar simultaneamente, raras leituras integrais de livros, mesmo os de alto interesse pessoal. Em leitores de series normais a incidência varia entre 24,8 % ( Robinson et all, 1985) a 45% ( Fisher & Miller, 1987).

Em populações onde há evidentes déficits na aquisição de leitura, a incidência variou de 46 a 50% (Robinson & Miles,1987), Whiting (1986), Adler &Atwood (1987) e Irlen (1983).  Em nossa instituição a incidência foi de 83%, justificada pelo fato de ser um serviço de referência e, portanto direcionado para o atendimento deste tipo de dificuldade (pesquisa apresentada no congresso de Neurociências UFMG 2010).

Niquini (2011) encontrou uma prevalência de 17,5% de portadores da SMI em escola da rede publica municipal da cidade de Belo Horizonte entre 450 alunos.  Como parte de tese de mestrado em Neurociências pela UFMG, foram analisados ainda o desempenho à leitura pré e pós intervenção com  lâminas de bloqueio espectral, ocorrendo significativa melhora de parâmetros como fluência, compreensão, eficiência leitora e movimentação sacádica.

É importante enfatizar que a síndrome pode coexistir com outras dificuldades no aprendizado e, portanto  a intervenção para a S.I. não elimina a necessidade de apoio multidisciplinar como o psicopedagógico para reabilitação dos conteúdos educacionais, os  fonológicos para os déficits auditivos, da terapia ocupacional  quando há alterações na coordenação visuomotora e os medicamentosos, sob orientação neuropsiquiátrica . Com freqüência, uma vez neutralizada a disfotopsia e distorções visuais, seus portadores melhoram progressivamente na leitura e atividades escolares, e vêem reduzida a necessidade de medicamentos voltados para distúrbios atencionais. Por esta razão, muitos colegas neurologistas que trabalham em parceria conosco tem preferido aguardar a resposta às intervenções visuais antes da prescrição medicamentosa habitualmente adotada neste grupo de pacientes.

Mesmo entre os colegas sem interesse direto na área de visão e aprendizagem, os novos conceitos e inter-relações da oftalmologia e neurociências poderão ser úteis para o encaminhamento correto e precoce dos casos suspeitos de déficits na eficiência do processamento visual.

 

Qual a relação entre os Processamentos Visual e Fonológico em disturbios de aprendizagem ? E na Dislexia ?

Hoje, à luz das contribuições da neurociência já esta bem estabelecida a influencia do processamento visual na leitura e aprendizagem. Inclusive, diversos autores, baseados em evidencias cientificas vem questionando se a própria dislexia não teria como causa básica, um déficit visual atencional e deste modo a tradicional decodificação fônica passaria a representar uma etapa subseqüente no processamento da leitura. Isto explicaria porque parte dos disléxicos após anos de intervenções fonoaudiológicas não respondem  satisfatoriamente à reabilitação. E também porque em casos onde o enfoque ortográfico (visual) precede o fônico, a aquisição da leitur      a é muitas vezes feita de forma mais rápida e proficiente.

Isto explicaria , segundo alguns autores, porque as crianças que aprendem o alfabeto antes de serem introduzidas à leitura são melhores leitoras do que aquelas que aprendem sons e letras antes do ensino formal de leitura. A inversão e omissão de letras são freqüentes em disléxicos – a sensibilidade ao sequenciamento espacial é um dos pontos preditivos na qualidade de leitura futura tanto em crianças como adultos. Erros de leitura em palavras inventadas ou inexistentes não são explicados por déficits fonológicos.

Há relatos de pacientes com lesão cerebral que mantêm boa consciência fonológica, mas mostram dificuldades com palavras inventadas.

Diante destas evidencias e questionamentos, faz-se necessária uma conscientização por parte de médicos e educadores de que nem todas as manifestações de dificuldades de leitura têm uma causa fonológica.  Para este grupo de pacientes a contribuição da oftalmologia é importante e torna-se um diferencial de significativo impacto em beneficio da aprendizagem.

Estima-se que 70 a 80%  da aprendizagem até os 12 anos  dependa do sentido visual  – o reconhecimento de seu impacto em déficits de leitura e aprendizagem e o fortalecimento na   capacidade de interação da oftalmologia com os demais profissionais da área de saúde e educação propiciará  novas modalidades de intervenções trans e multidisciplinares construindo um melhor  futuro educacional  e profissional para os portadores destes déficits.

O trabalho da Fundação Hospital de Olhos (Fundação  Holhos).

Atualmente, graças ao trabalho da Fundação Hospital de Olhos em Belo Horizonte, já existem 2000 profissionais distribuídos em 25 Estados brasileiros aptos a rastrear a Síndrome de Irlen. São profissionais da saúde e educação capacitados em cursos teórico-práticos de 30 horas em média sobre “Disturbios de Aprendizagem Relacionados à Visão”.  Os cursos os preparam para identificar as distorções visuoperceptuais nos portadores da Síndrome e intervir selecionando corretamente os overlays para uso individual.  Os overlays são um recurso assistivo de baixo custo, não invasivo e com alto potencial benefico nos casos bem indicados.  Este recurso deve ser usado em leituras durante as aulas, tarefas escolares e atendimentos de reforço escolar e intervenções psicopedagógicas, fonológicas, etc, por melhorarem as condições de conforto visual e contraste na leitura.

Através do “Projeto Bom Começo” e em parceria com a UFMG; a Fundação HOlhos acompanha a saúde visual e auditiva  desde a pré-escola, buscando detectar, intervir precocemente e prevenir as perdas progressivas e assim assegurar o futuro escolar  em caso de déficits.  No escopo deste projeto, promove-se ainda work-shops de 8 horas para os professores da rede publica do ensino fundamental ( 6900 professores  já  receberam  esta  formação em 8 estados ) conscientizando-os sobre o desenvolvimento e desempenho visual na infância, as habilidades a serem desenvolvidas e os impactos dos déficits na aprendizagem em geral ( áreas visuomotoras, processamento espacial, temporal, tridimensional, etc).  Os cursos discutem também as formas de intervenção por integração multidisciplinar incluindo temas da terapia ocupacional, fisioterapia, psicopedagogia etc. Os projetos em cada município abrangendo a   zona urbana e muitas vezes também a rural, são  realizados pelos  profissionais locais devidamente capacitados e sob nossa supervisão.  As ações posteriores de recuperação pedagógica dos alunos em defasagem na lecto-escrita e a distribuição dos overlays  é delegada  aos profissionais locais  estimulando  a  apropriação personalizada da ferramenta segundo o perfil da comunidade.

 

O “Projeto Bom Começo” já foi adquirido e está em aplicação em Vancouver, Canadá “The Right Start Project” desde 2012.  Há também uma modalidade mais completa para o monitoramento continuado e cadastro  geral da saude visual, auditiva,  cardiovascular,  peso, altura, imunização etc  de toda a população escolar  adquirido  pelas prefeituras  cujos programas foram desenvolvidos  com apoio da  Microsoft/ Fundação Bill e Melina Gates.

O Laboratório de Pesquisa Aplicada à Neurovisão – LAPAN é um centro de pesquisa  especializada no estudo do processamento visual e no desenvolvimento de tecnologia e inovação, contando com uma equipe multidisciplinar composta por cientistas de diversas áreas e formações.  Tem caráter translacional, visando fazer com que as descobertas saiam dos laboratórios de pesquisa e cheguem à pratica clinica.